Relatório da PF aponta uso de ferramentas espiãs contra adversários, jornalistas. autoridades e críticos do governo Jair Bolsonaro
Alexandre Ramagem, diretor-geral da Abin no governo Jair Bolsonaro (Foto: Divulgação I Abin I Agência Brasil )
A Polícia Federal deve concluir até o final de abril o inquérito que apura o funcionamento de uma estrutura clandestina de espionagem dentro da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). A investigação, iniciada em março de 2023, sobre o uso do programa espião FirstMile, se estendeu diante da identificação de outras ferramentas ilegais utilizadas por agentes da Abin, além da própria complexidade do caso. As informações são do jornal O Globo.
O FirstMile foi utilizado pela agência para monitorar a localização de alvos sem autorização judicial, por meio da triangulação de sinais de celulares. Desenvolvido por uma empresa israelense, o software permite acompanhar os passos do alvos que, neste caso, eram políticos, jornalistas, advogados e adversários do governo Bolsonaro. A denúncia levou a PF a abrir o inquérito para apurar o uso desse e de outros sistemas na estrutura da Abin.
Com o avanço das investigações, depoimentos de servidores e documentos apreendidos revelaram o uso de outros programas, como o Cobalt Strike e o LTE Sniffer. O primeiro, normalmente usado para simular ataques cibernéticos em testes de segurança, teria sido empregado para invadir computadores de autoridades paraguaias, com o objetivo de coletar informações sobre as negociações entre Brasil e Paraguai em torno das tarifas da usina hidrelétrica de Itaipu. De acordo com depoimento de um agente, a operação contou com autorização do então diretor da Abin no governo Bolsonaro.
A revelação provocou um constrangimento diplomático e levou o governo paraguaio a convocar o embaixador brasileiro para prestar esclarecimentos. Em nota, o Itamaraty afirmou que a autorização para a operação de inteligência foi concedida em junho de 2022, ainda sob Bolsonaro, mas suspensa em março de 2023, já no início do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Já o LTE Sniffer, segundo especialistas, atua como um “IMSI Catcher” — uma antena clandestina capaz de interceptar comunicações de redes celulares. Trata-se de uma ferramenta de código aberto, disponível gratuitamente na internet. Um agente da Abin ouvido pela PF disse que a tecnologia estava em avaliação para desenvolvimento de um modelo próprio da agência, voltado a missões de varredura em representações diplomáticas estrangeiras no Brasil.
O inquérito tem como um dos principais investigados o ex-diretor da Abin e atual deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), que já figura como réu no Supremo Tribunal Federal (STF) no caso da tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023. A Polícia Federal afirma que há conexões entre as duas investigações.
De acordo com o relatório da PF, um núcleo da agência — descrito como “núcleo de inteligência paralela” — teria sido instrumentalizado por Ramagem para garantir a permanência de Bolsonaro no poder. “Aparelhada” sob sua direção, essa estrutura teria sido usada para monitorar opositores e traçar estratégias de desgaste institucional.
A Polícia Federal aponta, ainda, que Ramagem orientava Bolsonaro a atacar a credibilidade do sistema eleitoral e a adotar uma postura “mais hostil” contra instituições democráticas. E-mails obtidos durante a investigação revelam mensagens com esse conteúdo. Em depoimento, Ramagem admitiu que redigia textos “para comunicação de fatos de possível interesse” do então mandatário, mas alegou não se lembrar se essas mensagens chegaram a ser entregues. Ele nega envolvimento na trama golpista e a existência de uma estrutura paralela dentro da Abin.
Procurada, a Abin não se manifestou sobre o caso.
Fonte: Brasil 247 com informações do jornal O Globo
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