Jurista Gustavo Sampaio, da UFF, aponta que Constituição não pode ser aplicada de forma literal para contradizer a si mesma
O professor de direito constitucional Gustavo Sampaio, da Universidade Federal Fluminense, afirmou ao blog da Camila Bomfim, no portal g1, que o projeto de lei em discussão na Câmara para anistiar os golpistas de 8 de janeiro de 2023 é inconstitucional.
O texto pode ser votado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara nesta terça (10). Se aprovado, ainda terá de passar pelo plenário, pelo Senado e pela sanção de Lula para virar lei.
O jurista destaca que um episódio que representa um ataque à democracia também significa um ataque ao Congresso – que sequer funcionaria, não fosse a democracia.
Ou seja: é como se, em nome de uma guerra política , uma ala da Câmara quisesse perdoar quem atentou contra a própria Casa.
Segundo o jurista, a interpretação sistemática dos princípios e das regras da Constituição Federal mostra que o que ocorreu no 8 de janeiro foram crimes contra o estado democrático de Direito. E que, portanto,
“Torna-se constitucionalmente contraditório, e portanto inconstitucional, que o parlamento conceda anistia a quem atentou contra a sua própria existência”, afirma Sampaio.
O jurista diz ainda que, por mais que a Constituição preveja que a Câmara possa conceder anistia, há dispositivos no nosso ordenamento jurídico criados para proteger a nossa democracia.
“A lei nº 14.197/2021, ao acrescer ao Código Penal o título dos crimes contra o Estado Democrático de Direito, teve por mérito proteger a própria democracia, o próprio Parlamento que, ao fim e ao cabo, titulariza a competência para conceder anistia”, cita Gustavo Sampaio.
“Se a derrubada do regime democrático compromete a própria independência do Congresso Nacional em si, expressão maior da vontade popular e do regime representativo, conceder anistia a praticante de delitos contra o Estado Democrático pode ser interpretado como extravasamento aos limites constitucionalmnte dados ao Parlamento para concedê-la”, complementa.
Além disso, juristas ouvidos pela Globonews também são claros ao dizer que a Câmara não pode sair derrubando decisões de outro poder – que deputados não tem essa prerrogativa de revisar decisões do Supremo Tribunal Federal.
PL da Anistia
Nesta terça (10), a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados deve começar a analisar nesta terça-feira (10) o projeto de lei que propõe anistia aos vândalos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
Os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 resultaram na invasão e depredação das sedes dos Três Poderes em Brasília por grupos que tinham reivindicações antidemocráticas.
Os vândalos depredaram prédios do Congresso Nacional, do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Palácio do Planalto, em uma tentativa de desestabilizar a ordem.
Desde então, os envolvidos têm sido processados e julgados pelo STF.
Segundo o relator do projeto de lei, deputado Rodrigo Valadares (União-SE), o texto vai anistiar envolvidos que tiverem relação com a depredação de 8 de janeiro.
Mas não há clareza se valerá só para quem já foi preso ou também para quem eventualmente for preso no futuro.
“Ainda não sabemos até que ponto essa anistia pode chegar. Se será apenas para os presos ou valerá para pessoas investigadas que ainda poderão ser presas. […] Fatos anteriores ao 8 de janeiro não estão contemplados no PL”, completou o relator.
Embora esteja pautado para esta terça, o projeto pode ter a votação adiada por um pedido de vista (mais tempo para análise).
Se isso acontecer, a votação deve ficar para depois das eleições municipais, em outubro.
Nos bastidores, a proposta tem sido avaliada por parlamentares aliados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), derrotado nas urnas em 2022, como um “moeda de troca” na disputa pela sucessão de Arthur Lira (PP-AL) ao comando da Câmara.
Desde o último ano, parlamentares de oposição têm dito que podem condicionar o apoio ao comprometimento de um candidato com o eventual avanço do texto na Casa.
Fonte: Agenda do Poder com informações da jornalista Camila Bomfim do portal G1