Falta
do que comer é maior entre famílias com chefia feminina
A insegurança alimentar grave é realidade em 7,9% das casas
na capital fluminense. Em números absolutos, são 489 mil
pessoas que passam fome. Cerca de 2 milhões de cariocas convivem com
algum grau de insegurança alimentar (seja leve, moderada ou
grave). Os dados inéditos fazem parte do I Inquérito sobre a Insegurança
Alimentar no Município do Rio de Janeiro – o Mapa da Fome da Cidade do
Rio de Janeiro.
A pesquisa revela ainda que o acesso à
alimentação adequada se dá de forma desigual na geografia da capital
fluminense. A Área de Planejamento (AE) 3 (Zona Norte sem a Grande Tijuca)
é a mais atingida pela fome – ela se apresenta em 10,1% das
casas. A fome é maior nos lares chefiados por pessoas negras (em 9,5%
desses domicílios). Quando o estudo faz a análise por gênero, 8,3% das
famílias comandadas por mulheres também não têm o que comer.
O Mapa da Fome da Cidade do Rio de Janeiro é uma
parceria entre a Frente Parlamentar contra a Fome e a Miséria no
Município do Rio de Janeiro da Câmara Municipal e o Instituto de Nutrição
Josué de Castro (INJC/UFRJ). Com o lançamento do estudo, o Rio de Janeiro
se torna a primeira cidade brasileira a mapear a insegurança alimentar e a fome
em nível municipal.
Outros indicadores mostram que a falta de comida
atinge 16,6% das famílias lideradas por
pessoas com escolaridade mais baixa. A fome também atinge 18,3%
das casas onde a pessoa de referência está desempregada, e em 34,7% dos
domicílios com renda per capita mais baixa.
“O perfil da pessoa que passa fome no Rio acompanha as
desigualdades nacionais. As famílias que têm insegurança alimentar grave têm a
chefia feminina, que tenha pessoa preta ou parda, com menor escolaridade com
fundamental incompleto, desempregado e famílias de menor renda, inferior a um
quarto do salário mínimo per capita”, disse Rosana Salles-Costa, professora e
pesquisadora do INJC/UFRJ.
Dados
As estatísticas foram coletadas entre novembro
de 2023 e janeiro de 2024, a partir da realização de
entrevistas em 2 mil domicílios das cinco APs do
município. A segurança alimentar foi medida pela Escala
Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA), que também é utilizada pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
“O Mapa da Fome do Rio é um importante legado
da Frente Parlamentar Contra a Fome e a Miséria para a população
carioca. Ele servirá de base para fornecer critérios técnicos para a
implementação de políticas públicas, e com isso auxiliar na ampliação dos
restaurantes populares, cozinhas comunitárias, banco de alimentos e demais
instalações de programas de segurança alimentar”, afirmou o vereador Dr. Marcos
Paulo (PT), presidente da Frente Parlamentar Contra a Fome e a Miséria no
Município do Rio de Janeiro.
O Mapa da Fome da Cidade do Rio de Janeiro revela que
o percentual de fome no município é quase o dobro se comparado com o
dado nacional recém-divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD) divulgada em abril, a fome esteve presente em 4,1% das
casas brasileiras. No estado do Rio de Janeiro, ainda segundo a PNAD, o
percentual de 3,1% ressalta ainda mais a situação aguda
da capital fluminense.
Políticas
O estudo analisa as políticas públicas e
iniciativas – do governo ou da sociedade civil – que têm por objetivo assegurar
o direito à alimentação saudável. Os três restaurantes
populares municipais existentes (em Bonsucesso, Bangu e Campo
Grande) atenderam a apenas 6,9% da população
carioca. As cozinhas comunitárias e o programa Prato Feito Carioca foram
acessados, de agosto a outubro de 2023, por apenas 2,1% dos moradores da
cidade. As visitas às residências de agentes comunitários de saúde também
têm se mostrado escassas: 56,5% da população no município relatou não ter
recebido a visita nos últimos três meses.
O principal programa de segurança alimentar do
município consiste no acompanhamento assistencial e nutricional em
unidades de acolhimento (abrigos, hotéis e albergues noturnos) de adultos,
crianças e adolescentes. Foram identificados 34 equipamentos públicos (que
atendem a 1,5 mil pessoas), e cinco hotéis (com
500 hóspedes). Há apenas um albergue voltado para a população LGBTQIAP+,
localizado na AP 1 (Centro e zona portuária). Na AP 2 (zona sul), há
somente duas unidades de reinserção social, localizadas no Catete e em
Laranjeiras.
“Para reverter esse quadro, é preciso ampliar os
equipamentos públicos para essas pessoas em maior vulnerabilidade no acesso à
alimentação, que seriam as cozinhas comunitárias cariocas como também os
restaurantes populares. Em outra frente, é necessário aumentar a renda,
melhorar a escolaridade e o emprego. Porque daí eu consigo reduzir a
desigualdade e os níveis de insegurança alimentar”, disse Rosana Salles-Costa.
Insegurança hídrica
A insegurança hídrica também é avaliada pelo Mapa da Fome da
capital carioca. O estudo revela que 15% dos lares cariocas não
tiveram fornecimento regular de água ou sofreram com a falta de água
potável. Dessas famílias, 27% se encontraram em situação de fome. As
regiões mais afetadas pela escassez de recursos hídricos são
Centro e zona portuária), com 24,3% e a zona norte sem a Grande
Tijuca, com 21,7%.
“É urgente construir uma agenda de projetos de lei,
políticas públicas, estratégias e outras ações. O número de cozinhas
comunitárias e restaurantes populares, por exemplo, deve aumentar. São esses os
espaços que asseguram a distribuição de refeições saudáveis e gratuitas ou com
preços acessíveis em toda a cidade do Rio de Janeiro”, afirma o vereador Dr.
Marcos Paulo.
Fonte: Agência Brasil