RIO DE JANEIRO/BRASÍLIA (Reuters) - O ministro da Economia, Paulo Guedes, defendeu nesta quinta-feira a desindexação de despesas do Orçamento, mas disse que o governo não mudará regras de reajuste do salário mínimo e de aposentadorias "no meio do jogo" e que a correção desses gastos continuará a ser feita com base na inflação.
"Você está com o jogo correndo, você não vai mudar de repente a regra agora. A aposentadoria e o salário mínimo vão subir de acordo com a inflação porque é o que está valendo", afirmou Guedes a jornalistas após evento no Rio.
Questionado sobre notícia veiculada no jornal Folha de S.Paulo de que o plano do governo seria indexar salário mínimo e aposentadorias à expectativa de inflação futura --e não à inflação do ano anterior, como ocorre atualmente--, Guedes disse que não haverá mudanças que prejudiquem os mais frágeis.
"A gente não vai no meio do jogo mudar a regra para atrapalhar alguém. É garantido que vai ser pelo menos a inflação passada", ressaltou.
Apesar da negativa, Guedes disse que parlamentares já reconhecem a importância de desvincular e desindexar o Orçamento, dando protagonismo à classe política nas decisões sobre as contas públicas.
Na prática, ao desvincular o Orçamento, o governo fica desobrigado a enviar recursos a áreas que hoje possuem destinações carimbadas. Da mesma forma, a desindexação acabaria com a exigência de correção de gastos por índices pré-derterminados, como ocorre hoje com o reajuste do salário mínimo pela inflação.
As mudanças dariam mais flexibilidade à gestão do Orçamento, reduzindo obstáculos como o que o governo tem enfrentado para manter um pagamento maior para o Auxílio Brasil.
Guedes disse que o governo prepara uma Proposta de Emenda à Constituição para viabilizar o pagamento de um valor de 600 reais para o auxílio a partir de 2023, por meio da taxação lucros e dividendos.
O texto, previsto para ser apresentado logo após o resultado da eleição, também deve trazer mudanças na regra do teto de gastos, afirmou Guedes, acrescentando que o Congresso poderá aproveitar a discussão do tema para propor a desindexação e a desvinculação de despesas orçamentárias.
A discussão sobre uma possível alteração na correção do salário mínimo que desse espaço a reajustes inferiores à inflação passada foi explorada pela campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nesta quinta. No Twitter, Lula afirmou que, caso eleito, voltará a dar aumento real ao salário mínimo. Seu candidato à vice, Geraldo Alckmin tuitou que vincular o salário mínimo à inflação prevista é uma "desumanidade sem tamanho".
Ex-presidente do Banco Central no governo Lula, Henrique Meirelles afirmou que o plano do governo jogaria "nas costas da população a conta pelas medidas eleitoreiras deste ano".
INDEXAÇÕES BURRAS
Na entrevista, Guedes disse que desde o início do governo afirma que "vinculações e indexações às vezes são burras", ressaltando que a retirada das amarras criaria condições para que o Orçamento fosse definido pela classe política, com maior liberdade do Congresso para aumentar ou reduzir despesas dos diferentes programas de acordo com as necessidades de cada ano.
O ministro argumentou que ao desvincular e desindexar as contas, o governo e o Congresso poderiam optar, por exemplo, por gastar mais verbas com saúde ou conceder reajustes acima da inflação para o salário mínimo. Ele não mencionou que a política de ganho real para o piso nacional, que vigorou em governos anteriores, foi interrompida durante sua gestão.
Dois técnicos do Ministério da Economia diretamente envolvidos com o tema disseram à Reuters, sob condição de anonimato, que a ideia de usar a projeção futura dos índices de preços para corrigir o salário mínimo e benefícios sociais, abrindo margem para reajustes abaixo da inflação, está entre as possibilidades que já foram estudadas pela pasta. Ambos enfatizaram não se tratar de uma proposta concreta ou já construída para ser apresentada.
"São ideias que sempre existiram nas discussões de desindexação. A desindexação pode se dar de várias formas e em diversos graus", disse uma das autoridades. "Estamos estudando a flexibilização do teto, mas o salário mínimo e os benefícios continuarão corrigidos pela inflação."
O segundo técnico disse que a proposta estaria "no campo das ideias", sem plano para apresentação. Ele ressaltou que no caso de reajustes salariais de servidores públicos, Guedes já defendeu o mecanismo que usa a inflação futura para fazer o cálculo.
O ministro ainda afirmou na entrevista que depois da contribuição dos servidores públicos durante a pandemia, o governo se programa para voltar a dar reajustes ao funcionalismo. Em 2023, o aumento poderia ser entre 5% e 5,5%, a um custo de 10 bilhões de reais, afirmou.
Como exemplos de mudanças ao teto de gastos que devem ser propostas pelo governo se houver acordo político, Guedes citou que repasses feitos pelo governo federal a Estados e municípios precisam ficar fora da regra e que é preciso haver a previsão de excepcionalização também em casos de guerra.
"Você precisa ter a tributação de lucros e dividendos, para distribuir os recursos para os mais frágeis. Aproveitando que nós vamos fazer isso nós vamos consertar o teto", disse Guedes.