Para maioria dos brasileiros, omissão do governo em
garantir direitos sociais, econômicos e ambientais é desesperadora
O ex-presidente Lula, que terminou o seu segundo mandato com 83% de aprovação e 4% de reprovação, de acordo com pesquisa Datafolha de dezembro de 2010 - Rovena Rosa/Agência Brasil
Jair
Bolsonaro (60% de rejeição, 22% de intenção de voto, segundo Datafolha) aposta
no pagamento dos R$ 400 do Auxílio Brasil para retirar votos dos mais pobres de
Lula (34% de rejeição, 48% de voto) e levar a disputa ao segundo turno.
Contudo, pobreza não é apenas questão de renda, e o pagamento pode não ser
o bastante para fazer esquecer a vida sob os anos Lula.
Há um
pacote de condições mínimas, impossíveis de serem adquiridas pelos mais pobres,
que precisa ser garantido pelo Estado, conforme o artigo 3º da Constituição -
que elenca a promoção do bem-estar de todos como objetivo da República. A
negação desse pacote coloca dezenas de milhões de brasileiros abaixo da linha
de dignidade.
A questão
é que o governo Bolsonaro vem sendo um desastre para efetivar os direitos
sociais previstos no artigo 6º da Constituição.
Educação?
Transformou estudantes e professores em inimigos, tirou recursos de pesquisa,
promoveu o caos no Enem, bombardeou universidades. Saúde? Aliou-se ao
coronavírus, sabotando sistematicamente os esforços para o combate à pandemia,
o que resultou em quase 620 mil mortos.
Trabalho?
Diante de recordes de desemprego, apresentou medidas que retiravam ainda mais
proteções dos trabalhadores e assistiu passivo à renda média cair 11% no último
ano. Moradia? Desestruturou o Minha Casa, Minha Vida, cortando subsídios para
as famílias de baixa renda, exatamente quem mais precisa de ajuda.
Alimentação? Suspendeu o auxílio emergencial no momento em que a pandemia
chegava a seu auge, levando mais de 19 milhões de brasileiros a passarem fome.
Some-se a
isso uma inflação de dois dígitos especialmente violenta com quem ganha menos,
devorando suas parcas remunerações e os benefícios sociais. Comida, gasolina,
gás de cozinha, luz, tudo está mais caro e menos acessível.
Já seria
difícil conviver com um cenário de alta do petróleo no mercado internacional,
mas o presidente fez o desfavor de bombar o preço do dólar com a insegurança
trazida por suas micaretas golpistas e a incerteza da falta de rumo na
economia. Além disso, o preço da energia elétrica foi às alturas porque o
governo ignorou os alertas das mudanças climáticas e deixou os reservatórios
esvaziarem.
De acordo
com o Datafolha, divulgado nesta sexta (17), Bolsonaro segue com 53% de
rejeição, o que pode melhorar com o pagamento do Auxílio Brasil, a retomada da
economia e, com isso, de empregos, e a volta a uma vida (quase) normal com a vacinação
- não graças a ele, claro, que ainda hoje ataca imunizantes. Mas uma coisa
é uma melhora, a outra é competir com a memória de uma época em que a vida era
melhor.
Essa
comparação vem sendo sistematicamente explorada pelo ex-presidente Lula, que terminou
o seu segundo mandato com 83% de aprovação e 4% de reprovação, de acordo com
pesquisa Datafolha de dezembro de 2010. Em outras palavras, pagar um auxílio
maior que o Bolsa Família pode ajudar Bolsonaro. Mas sem um Estado que garanta
um mínimo de bem-estar social, o povo pode ser grato pelos R$ 400 e ainda assim preferir o ex.
Isso é de
difícil compreensão para um governo que prefere entregar vouchers para família
pobres pagarem creches particulares, muitas vezes instituições caça-níqueis, do
que garantir equipamentos públicos de qualidade.
Bolsonaro
vem cumprindo a promessa de reduzir a "interferência" do governo
federal na vida das pessoas. Para alguns grupos, como grileiros de terra, o
naco anacrônico do agronegócio, garimpeiros ilegais, milicianos, religiosos
ultraconservadores, defensores do armamento da população e o pessoal da extrema
direita, isso soa como música.
Mas para
a maioria dos brasileiros, a omissão do governo em garantir direitos sociais,
econômicos, ambientais e culturais é desesperadora. E esse desespero deve ser
refletir nas urnas no ano que vem, mesmo com os R$ 400 em conta. E isso se o
povão compreender que o Auxílio Brasil veio substituir o Bolsa ou é apenas mais
uma etapa temporária do auxílio emergencial.
Conforme
alertaram Mauro Paulino e Alessandro Janoni, do Datafolha, "no
levantamento atual, percebe-se que a popularidade de Bolsonaro entre os que
recebiam o Bolsa Família é seis pontos inferior à observada entre os que não
tinham o benefício, contraste que não se verifica em relação aos que já
acessaram recursos do Auxílio Brasil". Irônico que um governo
acostumado à desinformação esteja com problemas de comunicação.
Fonte:
Brasil de Fato