Novas
declarações revelam o conluio entre a Lava Jato e o conglomerado de mídia da
família Marinho. Em 2019, o professor Joaquim Falcão, lobista da emissora, teve
um almoço com Deltan Dallagnol e disse ao então procurador que "o excesso
do devido processo legal é uma doença. Inchaço. Patologia"
Professor Joaquim Falcão, Deltan Dallagnol e a família Marinho
Por Lenio Luiz Streck, Conjur - A cumplicidade entre o lavajatismo,
setores da academia e da grande mídia fica nítida em um dos diálogos periciados
que agora vem à tona. Trata-se de um almoço que Dallagnol conta, com orgulho,
aos seus companheiros de grupo Telegram
O professor
Joaquim Falcão foi anfitrião de almoço com o chefão da Globo e ele, Deltan:
Dallagnol
(12h42min) – "Caros, esqueci de contar algo importante... Na correria,
passou. Mas tem de ficar restrito. Almocei na quarta com João Roberto Marinho.
É ele quem, segundo muitos, manda de fato na Globo. Responsável pela área
editorial do grupo. A pessoa que mais manda na área de comunicação no país.
Quem marcou foi Joaquim Falcão. Para evitar repercussão negativa, foi na casa
do Falcão. Falei do grupo, do trabalho e das 10 medidas. Falei da guerra de comunicação
que há no caso. Ele ouviu atentamente e deu seu apoio às dez medidas. Vai abrir
espaço de publicidade na Globo gratuitamente."
Andrey Mendonça:
(13h04min) - "Parabéns Deltinha! [tinha cinco emojis de palminhas!)"
Januário
Paludo: (13h04 min) – "Bah". (os grifos são meus)
Na
aludida reunião ("restrita”, nas palavras de Dallagnol), na casa do
professor Falcão, foi montada a estratégia de apoio da Globo ao indigitado
projeto que, lembram, criava prova ilícita de boa-fé, fragilizava o Habeas
Corpus e outras gritantes inconstitucionalidades.
Isto quer dizer
que os participantes da reunião apoiavam os absurdos previstos no Projeto,
rejeitadas pelo Congresso Nacional em boa hora.
Tudo se
encaixa. Observe-se que, em 2019, o professor Joaquim Falcão chegou
a dizer que “o excesso do devido processo legal é uma doença. Inchaço.
Patologia. É o processualismo”.
A
questão é: o que seria excesso de devido processo legal? Uma doença? Permito-me
fazer a pergunta ao reverso: o que seria, então, uma deficiência de devido
processo legal? Como medir o devido processo? Quem vai dizer "a medida
exata do devido processo"?
Martonio Barreto
Lima, Marcelo Cattoni e eu escrevemos um artigo no ConJur no último dia 26
contestando um texto do professor Falcão em que ele faz uma ode ao "novo
Direito praticado no âmbito da 'lava Jato'". Perguntávamos: "O que é
isto 'o novo que pede passagem' do TRF-4 e Joaquim Falcão?"
Sem
dúvida, isso pode ajudar a explicar o tal regabofe ocorrido em 2015. Bom,
os participantes poderão até negar a consoada. Mas que Deltinha (sic) contou a
história direitinho, ah, isso contou. Como disse o procurador Januário,
"bah".
Bah,
digo eu! Leio que Deltan e outros procuradores foram ao STF para impedir a
liberação dos referidos diálogos. O ministro Lewandowski liberou uma parte e
pôs sigilo em outra parte. Lendo 10% das mensagens já provoca arrepios na
República. Imagina o que vem por aí.
Dallagnol
não quer que o país saiba que ele, em uma das conversas sobre o vazamento dos
diálogos entre Lula e Dilma, chamou o Direito Constitucional de
"filigrana" e que a política vale mais do que o Direito. Foi
explícito nisso. Com a concordância do procurador Januário Paludo.
Já Moro
continua negando a existência das mensagens. No fundo, ele imita o sofista
Górgias de Leôncio: as mensagens não existem; se existem, não são minhas; e se
são minhas, são ilegais.
O que
Moro e os membros da força-tarefa esquecem? Simples. Até nas faculdades de
direito que formam reacionários e fascistas se aprende, nos primeiros
semestres, uma coisa prosaica: uma prova, mesmo que decorrente de
"colheita" (sic) ilícita, pode sempre ser usada em favor do réu.
Portanto,
não adianta alguém dizer que as mensagens, porque foram hackeadas, não podem
ser usadas. Podem, sim. A doutrina processual, que eu saiba sem exceção, admite
o uso desse tipo de prova se for para beneficiar o réu.
O que
fica de tudo isso é que fiscais da lei, guardiões da Constituição combinaram
com o juiz da causa um conjunto de atitudes e estratégias.
Sendo um
pouco jus-sarcástico, acho que as mensagens deveriam ser classificadas como
"segredo de Estado". Explico: Imaginemos se os estudantes de Direito
lerem todo esse material e lerem também que os protagonistas disseram que tudo
isso "era normal". E que gente do Direito defendia esse
"normal". A chance de os alunos desistirem do direito é grande.
Porque isso tudo é antítese do que os professores escrevem e o que diz na
Constituição.
Daí
talvez uma tarja no material: O uso desse material pode abalar sua confiança na
justiça.
Se
tomarem conhecimento do material, os alunos fugirão dos cursos de Direito. Irão
fazer cursos de política, coach ou estratégia. Tudo, menos Direito.