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Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom |
O governo Jair Bolsonaro planeja enviar ao
Congresso Nacional uma MP (medida provisória) que revê regras previdenciárias
para deflagrar um pente-fino em todos os benefícios pagos pelo INSS (Instituto
Nacional do Seguro Social).
Para viabilizar a operação, a MP estabelecerá o
pagamento de um bônus de R$ 57,50 a técnicos e analistas do seguro social que
identificarem irregularidades em aposentadorias e pensões.
A medida provisória será apresentada pelo governo
Bolsonaro como um conjunto de ações para aperfeiçoamento e modernização da
legislação.
A expectativa é que as novas regras possam gerar
uma economia de R$ 9,3 bilhões em um ano, já descontados os pagamentos dos
bônus.
O valor corresponde a 4,2% do déficit previsto no
RGPS (Regime Geral de Previdência Social) para este ano. É um valor ínfimo
perto de um rombo total que deve bater em R$ 220 bilhões.
Quem acompanha o trabalho, porém, defende que a MP
terá o efeito de funcionar como uma espécie de ação moralizadora, para melhorar
a organização do INSS, corrigir distorções legais e coibir fraudes enquanto se
finaliza uma proposta mais ampla de reforma da Previdência.
Pela medida provisória, entram na mira dos fiscais
a pensão por morte, a aposentadoria rural e o auxílio-reclusão.
No caso de concessão de pensão por morte para quem não era formalmente casado,
uma das mudanças propostas na medida provisória é exigir, além da demonstração
de dependência econômica, a chamada prova documental contemporânea –um
documento que comprove a união na ocasião da morte.
O governo entende que a regra atual, que permite a
comprovação de união estável apenas com apresentação de testemunhas, abre
brechas para simulações e fraudes.
Na aposentadoria rural, a MP substitui a declaração
do sindicato rural pela autodeclaração do segurado.
Entidades credenciadas pelo Pronater (Programa
Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural na Agricultura Familiar e na
Reforma Agrária) ficarão responsáveis pela homologação dessa autodeclaração do
beneficiário.
Para o governo Bolsonaro, o reconhecimento de
direitos por meio do sistema sindical é um resquício inadequado da mistura
entre o Estado e essas entidades.
O auxílio-reclusão, benefício pago aos dependentes
do trabalhador preso, passa a ter um período de carência (tempo mínimo de
contribuição consecutiva ao INSS) de 12 meses.
O benefício não poderá ser acumulado a outros e
haverá aferição de baixa renda com base em uma média dos salários. Hoje, o
limite de renda é definido a partir do último salário do trabalhador preso.
O governo estima que essa regra consiga reduzir a
concessão do benefício para pessoas fora do perfil de renda, mas que estão
desempregadas na véspera da prisão.
Esse modelo de conferência dos benefícios que a
equipe de Bolsonaro quer adotar com a MP é parecido com o usado pela gestão
Michel Temer (MDB) no pente-fino realizado nos auxílios-doença e nas
aposentadorias por invalidez pagos há mais de dois anos.
Desde 2016, os peritos médicos previdenciários
estão recebendo R$ 60 por exame extra realizado nos postos do INSS.
Até 15 de dezembro de 2018, quase 1,2 milhão de
perícias tinham sido realizadas no pente-fino dos benefícios por incapacidade.
Cerca de 651 mil segurados, praticamente a metade
dos que foram avaliados nos exames periciais, tiveram o pagamento cortado. A
economia com esses pagamentos foi de R$ 13,8 bilhões.
Segundo pessoas que participaram da elaboração da
MP, o bônus dos peritos será prorrogado por mais um ano, o pente-fino dos
benefícios por incapacidade será estendido e a atuação dos médicos será
ampliada.
Eles trabalharão também em ações judiciais e em
casos de revisão de BPC (Benefício de Prestação Continuada).
As perícias do pente-fino, que até então convocaram
benefícios sem avaliação há mais de dois anos, chegarão a segurados que recebem
auxílio ou aposentadoria por invalidez há mais de seis meses.
O governo estima gastar R$ 56,9 milhões com o
pagamento do bônus aos técnicos e analistas previdenciários.
Em 2018, o INSS tentou viabilizar o pagamento de
uma bonificação para acelerar a análise de pedidos de benefícios e revisões e
reduzir os gastos com a correção monetária da fila de espera, mas o dinheiro
não foi liberado.
Sempre que o INSS leva mais de 45 dias para
responder a um pedido, o benefício, quando concedido, é pago com correção pelo
INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor).
O governo calcula uma despesa superior a R$ 600
milhões ao ano com essa correção, além de aumento nas disputas judiciais.
Levantamento realizado pelo TCU (Tribunal de Contas
da União) estima que mais de R$ 92 bilhões são pagos todos os anos após decisão
judicial.
A expectativa da gestão Bolsonaro é que o incentivo
à conclusão de processos com suspeita de irregularidades resulte em uma
economia mensal de R$ 188 milhões, que poderia ser ampliada pela perspectiva de
cobrar a devolução do que foi pago irregularmente.
Para essa apuração, a medida provisória define que
serão considerados suspeitos os benefícios com indícios de acumulação indevida
(quando um segurado mantém dois benefícios que não poderiam ser pagos ao mesmo
tempo), suspeita de morte do beneficiário e BPC fora dos parâmetros previstos
em lei.
Os critérios são baseados em apontamentos do TCU em
fiscalizações e auditorias.
Segundo o INSS, 955,2 mil processos estavam
parados, em fevereiro de 2018, com suspeitas de irregularidades.
A média anual de análise de processos nas APS
(Agências da Previdência Social) ficou, entre 2010 e 2017, em 178.335 casos.
Para que o conjunto de novas regras possa ser
adotado, e o pente-fino, posto em prática, a MP vai alterar boa parte do
arcabouço legal previdenciário dos últimos 30 anos.
Serão revisados trechos de seis leis que foram
promulgadas entre 1991 e 2017.