Eduardo
Cunha, que virou presidente da Câmara comprando deputados, usava sua bancada
para tentar extorquir o governo da presidente Dilma Rousseff; Michel Temer,
beneficiário do golpe de Cunha, está nu e foi revelado ao País como um
profissional da arrecadação de propinas; as delações da Odebrecht e da JBS
também confirmaram que Dilma demitiu um operador de Temer e reduziu pela metade
o contrato de uma megapropina para o PMDB; além dos dois, Aécio Neves era
também um profissional do crime – a tal ponto que Joesley Batista chegou a
pedir "pelo amor de Deus" para que ele parasse de pedir dinheiro;
Dilma fez de tudo para não se render à bandidagem e caiu; ainda assim, mesmo
depois de golpeada, ela seguiu altiva e mandou avisar que a luta pela reconquista
da democracia não tem data para acabar; a questão, agora, é: quando o Brasil
irá pedir desculpas a ela?
247 – A pedagogia de um golpe. Essa
poderia ser a narrativa dos últimos doze meses no Brasil.
Há
pouco mais de um ano, quando o escritor português Miguel Sousa Tavares definiu
a abertura do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff como
uma "assembleia de bandidos presidida por um bandido", muitos se
recusavam a acreditar numa definição tão óbvia e tão precisa.
Foi
preciso que os golpistas fossem caindo, um a um, para que a verdade viesse à
tona.
O
primeiro a tombar foi Eduardo Cunha, hoje condenado a mais de 15 anos de
prisão, por corrupção, evasão de divisas e lavagem de dinheiro.
Pelas
delações da JBS, já se sabe que Cunha recebeu propinas para sair comprando
deputados – parlamentares que lhe foram fiéis na fatídica votação de 17 de
abril de 2016.
Com
sua bancada, alimentada por um mensalão particular, Cunha tentava extorquir o
governo federal.
Dilma,
na medida do possível, resistia.
A
tal ponto que, já no seu primeiro mandato, trocou todos os diretores da
Petrobras que acabaram presos em Curitiba, como Paulo Roberto Costa, Renato
Duque e Jorge Zelada – este, homem de confiança do PMDB na área internacional
da estatal. Nesta diretoria específica, ela reduziu em mais de 40% um
contrato que renderia uma propina de US$ 40 milhões para o PMDB, segundo ficou
acertado numa reunião presidida por Michel Temer (leia mais aqui).
Pelas
delações da JBS, soube-se também que, em seu primeiro mandato, Dilma demitiu
Wagner Rossi, que atuava como arrecadador de propinas para Temer (leia mais aqui), assim como demitiu outros notórios
personagens da "turma do Michel", como Moreira Franco, Eliseu Padilha
e Geddel Vieira Lima.
O caso Aécio
Ao
seu modo, Dilma foi conseguindo conter o apetite criminal do PMDB, mal
necessário para lhe garantir a governabilidade. O barco começou a virar quando
Cunha, graças a sua bancada mensaleira, conseguiu se eleger presidente da
Câmara dos Deputados, para, em seguida, se aliar ao senador (hoje afastado)
Aécio Neves (PSDB-MG), um derrotado ressentido que, de repente, se viu sem
nenhuma máquina política nas mãos, uma vez que perdera não só a presidência da
República, como também o governo de Minas Gerais.
O
casamento entre Cunha e Aécio era movido, agora se sabe, por propósitos
puramente criminais. Andrea, a irmã de Aécio, chegou a oferecer a presidência
da Vale ao empresário Joesley Batista por nada menos que R$ 40 milhões. Aécio
era tão guloso em sua demanda financeira que Joesley chegou a pedir "pelo
amor de Deus" para que ele parasse de pedir dinheiro (leia mais aqui).
E
foi Aécio quem contratou Janaina Paschoal, por R$ 45 mil, para que ela fizesse
o parecer das chamadas "pedaladas fiscais", que foi o pretexto para
jogar o Brasil no precipício. Golpeada a democracia, o Brasil passou a ser
governado, sem nenhum tipo de moderação, por uma verdadeira quadrilha. No
governo federal, já há nove ministros investigados e, nos próximos dias, o
próprio ocupante da presidência será investigado por corrupção, obstrução
judicial e organização criminosa – fato inédito na história brasileira.
O
responsável por essa tragédia, Aécio Neves, caiu em desgraça e até sua
contratada Janaina Paschoal hoje pede sua prisão (leia aqui).
A luta permanente pela
democracia
Mesmo
golpeada por delinquentes, Dilma Rousseff se manteve de cabeça erguida. Rodou o
mundo, denunciando o golpe, enquanto Temer, que usurpou sua presidência, não
conseguiu colocar os pés na rua. Viveu trancado em palácios, protegido pelo
silêncio de uma mídia decadente que, depois de apoiar o golpe militar de 1964,
não se redimiu do passado e se associou ao golpe parlamentar de 2016.
Embora
Temer esteja nos seus estertores, o golpe ainda não chegou ao fim – e não se
sabe se, após a inevitável queda do presidente-golpista, o Brasil terá um
reencontro com a democracia pela via das eleições diretas ou se haverá um pacto
oligárquico que preserve o atual status quo, após o sacrifício de um usurpador
que se tornou pesado demais para ser carregado.
Mas
o Brasil ainda deve um pedido de desculpas a Dilma: a presidente que caiu
porque tentou resistir à bandidagem que hoje governa o Brasil.
PS:
E antes que se diga "ah, mas e os R$ 150 milhões no exterior da JBS para
Lula e Dilma", a própria Globo já se retratou (leia mais aqui).