Mercado financeiro reage com instabilidade, inflação pressiona consumidores e comércio bilateral entra em colapso
Presidente dos EUA, Donald Trump, dá detalhes sobre tarifas no Rose Garden da Casa Branca em Washington, D.C. (Foto: REUTERS/Carlos Barria)
A escalada tarifária dos Estados Unidos contra a China, com a reação desta, atingiu um novo patamar durante os últimos dias e já produz efeitos negativos diretos sobre a economia norte-americana, além de agravar a tensão geopolítica global. Segundo reportagem da agência Reuters, os aumentos tarifários das duas maiores economias do mundo estão tornando "impossível" o comércio bilateral de bens, que em 2024 movimentou mais de US$ 650 bilhões.
O presidente Donald Trump voltou a defender as tarifas como ferramenta de barganha e declarou que os EUA “podem definir a tarifa, e eles [os chineses] podem escolher não negociar ou pagar”. No entanto, analistas ressaltam que, na prática, quem paga pelas tarifas é o importador norte-americano - ou seja, empresas e consumidores dos próprios Estados Unidos.
Apesar da retórica de enfrentamento, Trump também sinalizou que um acordo com a China poderia estar próximo, ao elogiar o presidente Xi Jinping. A ambiguidade, porém, não encontrou respaldo na realidade dos mercados nem em sinais concretos de negociação entre Washington e Pequim.
◎ Impacto interno: inflação, desconfiança e dólar pressionado
A reação do mercado foi imediata. Os rendimentos dos títulos do Tesouro norte-americano de 10 anos, que se movem de forma inversa aos preços dos papéis, registraram a maior alta semanal em mais de duas décadas, refletindo preocupações de que a China esteja vendendo parte significativa de seus ativos em dólar. Esse movimento, se confirmado, pode afetar a estabilidade da moeda norte-americana e dos mercados globais.
O secretário do Tesouro, Scott Bessent, acompanha de perto a volatilidade dos títulos. A secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, reforçou o tom de confronto: “O presidente deixou claro: se os Estados Unidos forem atingidos, ele revidará com mais força”, disse a jornalistas.
Ao mesmo tempo, dados econômicos recentes revelam pressões inflacionárias crescentes. O Índice de Preços ao Produtor (PPI) de março mostrou aumento nos preços de metais industriais como aço e alumínio — reflexo direto das tarifas de importação em vigor há um mês. Para o economista-chefe do Comerica Bank, Bill Adams, "a tarifação será muito mais relevante para o futuro da economia do que os dados passados". Ele projeta aceleração inflacionária nos próximos meses, caso as tarifas sejam mantidas.
O clima de incerteza também se traduz na confiança do consumidor. A Universidade de Michigan reportou que seu Índice de Sentimento do Consumidor caiu de 57,0 em março para 50,8 em abril, o pior desempenho desde a década de 1980. A pesquisa ainda revelou que as expectativas de inflação para 12 meses saltaram de 5,0% para 6,7%, o maior patamar desde 1981.
Pela primeira vez, a queda na confiança abrange até eleitores republicanos, sinalizando que os efeitos econômicos da guerra comercial começam a minar o apoio político de Trump em segmentos tradicionalmente fiéis.
◎ China endurece o discurso e prepara alternativas
Em Pequim, o governo chinês reagiu com firmeza às novas tarifas impostas pelos EUA, que agora atingem efetivamente 145% sobre diversas categorias de produtos chineses. Em resposta, o Ministério das Finanças da China anunciou novas tarifas e classificou a postura norte-americana como “intimidação e coerção completamente unilaterais”.
A embaixada chinesa em Washington foi ainda mais direta. O porta-voz Liu Pengyu declarou em redes sociais: “Se os EUA realmente querem dialogar, devem parar com seu comportamento caprichoso e destrutivo. A China jamais se curvará à pressão máxima dos EUA.”
Segundo analistas do banco suíço UBS, a declaração representa um reconhecimento tácito de que o comércio bilateral foi “essencialmente interrompido”. Isso marca um ponto de inflexão na relação econômica entre as duas potências e abre espaço para outras formas de retaliação chinesa, não necessariamente comerciais.
◎ Xi Jinping busca alianças e contesta unilateralismo
O presidente chinês também aproveitou a visita do primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, para criticar as ações dos EUA. Em declarações públicas, Xi afirmou que a China e a União Europeia deveriam se opor conjuntamente aos atos unilaterais de intimidação — numa tentativa clara de isolar Washington e formar um bloco de resistência diplomática ao protecionismo norte-americano.
Ao mesmo tempo, circulam dados mostrando o potencial impacto das tarifas nos preços de produtos importados nos EUA: aumentos estimados de 10% para equipamentos médicos, 30% para brinquedos, videogames e peças de computador, afetando diretamente o consumo das famílias norte-americanas.
◎ Comércio paralisado, mundo em alerta
O colapso do comércio entre China e EUA tem repercussões globais. Ambos os países integram cadeias de produção altamente interdependentes, e o travamento desse fluxo impacta indústrias de tecnologia, saúde, automobilística, têxtil e alimentícia em todo o mundo.
Além disso, o acirramento da retórica entre Washington e Pequim reforça a tendência de formação de blocos econômicos rivais, com a China buscando maior integração com países do Sul Global, BRICS e União Europeia, enquanto os EUA aprofundam a militarização do comércio.
A guerra comercial lançada por Trump está no centro da cena internacional, com efeitos palpáveis na economia doméstica dos EUA e com forte resposta da China. O comércio bilateral, que já foi símbolo de interdependência global, parece cada vez mais distante de se normalizar.
A aposta em tarifas como instrumento de força política revela seu custo elevado — tanto em termos econômicos quanto diplomáticos. E o mundo observa, atento, o desenrolar de uma disputa que pode moldar os rumos da economia global nos próximos anos.
Fonte: Brasil 247
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