segunda-feira, 24 de março de 2025

Brasil aparece duas vezes entre as dez secas mais severas do planeta

Estudo global e relatório da ONU revelam avanço das mega secas. Amazônia, Pantanal e Sudeste estão entre as regiões mais atingidas

Ribeirinhos carregam galões de água enquanto atravessam bancos de areia do rio Madeira até a comunidade Paraizinho, em meio à pior seca da história. Humaitá, Amazonas. REUTERS/Bruno Kelly (Foto: Bruno Kelly / Reuters)

Um amplo levantamento publicado pela revista científica Science trouxe um alerta preocupante: as chamadas mega secas — períodos de estiagem que duram no mínimo dois anos — têm se tornado mais frequentes, duradouras e intensas em várias partes do mundo desde 1980. O estudo analisou mais de 13 mil episódios entre 1980 e 2018 e colocou o Brasil em destaque negativo, com duas regiões entre as dez mais atingidas por secas extremas no período.

De acordo com a reportagem original da Science, repercutida pelo g1 e reforçada pelo mais recente relatório da Organização Meteorológica Mundial (OMM), os efeitos das mudanças climáticas estão agravando eventos de seca prolongada. No Brasil, o fenômeno ganhou proporções alarmantes, como a seca de 2024 — considerada a mais intensa e generalizada já registrada, afetando cerca de 60% do território nacional.

Entre as regiões brasileiras mais afetadas, destaca-se a Amazônia Sul-Ocidental, que enfrentou uma das piores secas globais entre 2010 e 2018. Abrangendo áreas do Acre, Amazonas, Rondônia, Mato Grosso, Bolívia e Peru, a seca devastou rios como o Madeira, o Negro e o Solimões, isolando comunidades ribeirinhas e expondo a floresta a incêndios recordes. Este episódio aparece em 7º lugar na lista das mega secas mais severas do planeta.

Outro caso emblemático ocorreu entre 2014 e 2017 no Sudeste, envolvendo os estados de Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo. Na época, o Sistema Cantareira, responsável pelo abastecimento de água para quase 9 milhões de pessoas na Grande São Paulo, operou com menos de 5% da capacidade, acionando o chamado “volume morto”. Essa seca figura como a 9ª mais grave do levantamento.

A escassez de chuvas também afetou severamente os reservatórios de Furnas, no Sul de Minas, e os sistemas Paraíba do Sul, no Rio de Janeiro, e Santa Maria da Vitória, no Espírito Santo — todos fundamentais para o abastecimento urbano e a geração de energia.

A pesquisa mapeou ainda que, além do Brasil, regiões como a bacia do Congo (com uma seca que durou quase uma década) e a Mongólia (onde a vegetação foi reduzida em 30% entre 2000 e 2011) também enfrentaram eventos extremos. Um dos pontos centrais do estudo é o impacto combinado de três fatores: aumento da temperatura global, redução das chuvas e maior evapotranspiração — processo que intensifica a perda de água para a atmosfera.

Segundo os cientistas, os efeitos da seca variam conforme a região do planeta. Em áreas quentes, a escassez de chuvas agrava o quadro. Já em regiões frias, a perda de água pela evaporação predomina. No Brasil, o Cerrado e o Pampa foram os biomas que mais perderam vegetação. A Amazônia, embora inicialmente mais resistente, sofreu severamente com estiagens prolongadas.

A OMM também destacou que, em 2023 e 2024, secas severas atingiram o interior da América do Sul, com recordes negativos nos rios Negro, em Manaus, e Paraguai, em Assunção. A situação no Brasil foi agravada por incêndios florestais em níveis históricos: o número de focos de calor na Amazônia em 2024 foi o maior desde 2010.

Fonte: Brasil 247 com informações do G1

Uma nota técnica do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), divulgada em dezembro, apontou que os episódios de seca se tornaram mais frequentes e intensos desde os anos 1990. Biomas como o Pantanal, o Cerrado e a Caatinga enfrentam impactos profundos, como perda de biodiversidade, comprometimento da produção agrícola e risco à geração de energia hidrelétrica.

Os efeitos do El Niño, que tradicionalmente reduzem a umidade nos trópicos, agora se estendem a áreas mais amplas, segundo a Science, indicando alterações na dinâmica global do clima. No Brasil, a seca de 2023-2024 foi a que mais bateu recordes negativos, com o Rio Negro atingindo o nível mais baixo em mais de 120 anos e deixando milhares de pessoas isoladas.

Cerca de 1,2 mil municípios brasileiros enfrentaram condições de seca severa ou extrema em 2024, afetando mais da metade do país. As perdas agrícolas chegaram a superar 80% em algumas regiões — só em outubro, 500 cidades relataram prejuízos catastróficos.

O impacto da seca ultrapassa os danos ambientais e agrícolas: também ameaça a estabilidade do sistema elétrico, devido à menor produção hidrelétrica. A dependência de rios para transporte, abastecimento e geração de energia torna o país ainda mais vulnerável.

O Cemaden já aprimora seus sistemas de alerta, mas especialistas concordam que apenas o esforço técnico não basta. A adaptação às novas condições climáticas exigirá mobilização conjunta entre governo, empresas, comunidades e cientistas.

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