Discussão central gira em torno da aplicação da Lei da Anistia a violações de direitos humanos cometidas por agentes do Estado durante o regime militar
O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou, nesta semana, o julgamento sobre a continuidade das investigações das mortes do ex-deputado Rubens Paiva e de outras duas vítimas da ditadura militar. O relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, votou para que os processos tenham "repercussão geral", garantindo que as decisões possam ser aplicadas a outros casos semelhantes. A posição do relator, segundo o Estadão Conteúdo, foi acompanhada pelos ministros Luís Roberto Barroso, presidente da Corte, Luiz Fux e Flávio Dino. O julgamento segue no plenário virtual até a próxima sexta-feira (16).
A discussão central gira em torno da aplicação da Lei da Anistia a violações de direitos humanos cometidas por agentes do Estado durante o regime militar. Em seu voto, Moraes argumentou que, por se tratar de "gravíssima violação de direitos humanos que perdura por quase 50 anos", a repercussão geral é "indiscutível". Ainda de acordo com a reportagem, ele também ressaltou que os três casos analisados envolvem questões de grande relevância para os direitos humanos no Brasil.
A repercussão geral é um mecanismo jurídico que permite que temas analisados em recursos extraordinários possam ter suas decisões aplicadas a outros processos semelhantes, considerando questões econômicas, políticas, sociais ou jurídicas de grande impacto.
Nos três recursos analisados, o Ministério Público Federal (MPF) busca a responsabilização penal de agentes públicos envolvidos no desaparecimento de opositores do regime. O MPF argumenta que os crimes em questão são de lesa-humanidade e, portanto, não estariam cobertos pela Lei da Anistia. A tese do "crime permanente" ou "crime continuado" tem sido base para diversas ações do MPF, que não têm sido acolhidas pela Justiça devido às restrições impostas pela anistia.
Sancionada pelo então presidente João Batista Figueiredo, a Lei da Anistia, de 1979, proibiu a punição de crimes cometidos até sua entrada em vigor, concedendo indulto a crimes políticos e conexos ocorridos entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979.
Entre os acusados pelo MPF estão os militares José Antônio Nogueira Belham, Rubens Paim Sampaio, Raymundo Ronaldo Campos, Jurandir Ochsendorf e Souza, Jacy Ochsendorf e Souza, Luiz Mário Valle Correia Lima, Luiz Timótheo de Lima, Roberto Augusto de Mattos Duque Estrada, Dulene Aleixo Garcez dos Reis e Valter da Costa Jacarandá, além do médico legista Harry Shibata.
Os três processos tratam do desaparecimento de Rubens Paiva e Mário Alves de Souza Vieira, cujos corpos nunca foram encontrados, e da morte de Helber José Gomes Goulart, cujos restos mortais foram identificados no Cemitério de Perus, em 1992.
A discussão sobre a responsabilização dos agentes da ditadura voltou a ganhar força com o lançamento do filme Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, que retrata a história de Eunice Paiva após o desaparecimento de seu marido, Rubens Paiva. O longa foi indicado ao Oscar em três categorias.
Rubens Paiva foi detido em casa no dia 20 de janeiro de 1971 e levado ao Destacamento de Operações de Informações-Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), no Rio de Janeiro, onde foi torturado e morto. O ex-deputado teve o mandato cassado pelo golpe militar de 1964 e chegou a se exilar por nove meses, retornando posteriormente ao Brasil, onde trabalhou como engenheiro. Sua prisão ocorreu após militares interceptarem cartas de exilados endereçadas a ele.
O julgamento do STF pode abrir um precedente histórico para a revisão da Lei da Anistia, permitindo que crimes cometidos por agentes do Estado durante a ditadura sejam investigados e julgados, mesmo passadas mais de quatro décadas do fim do regime militar.
Fonte: Brasil 247 com Estadão Conteúdo
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