segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

Alta dos alimentos compromete 22% do orçamento das famílias mais pobres

Estudo da FGV revela aumento expressivo nos gastos com comida, especialmente entre famílias de baixa renda

Preços de alimentos exibidos do lado de fora de um supermercado no Rio de Janeiro (Foto: REUTERS/Ricardo Moraes)

A inflação dos alimentos tem pressionado o bolso dos brasileiros de forma crescente. Conforme matéria do jornal O Globo, um estudo exclusivo do economista André Braz, da FGV, revela que os preços dos itens básicos vêm comprometendo uma parcela cada vez maior da renda familiar – fato que tem efeitos particularmente severos para as famílias de menor poder aquisitivo.

Recentes análises apontam que o consumo de alimentos por famílias que recebem de 1 a 1,5 salário mínimo já representa 22,61% do orçamento, enquanto, em janeiro de 2018, esse valor era de 18,44%. Esse acréscimo, mesmo diante do reajuste do salário mínimo – atualmente em R$ 1.518 –, evidencia como a alta dos preços se faz sentir de forma aguda. Desde o início de 2020, o setor de alimentação residencial acumulou alta de 55,87%, bem acima dos 33,46% medidos pelo IPCA no mesmo período.

O economista André Braz esclarece: "como é um consumo de itens básicos, você pode até substituir itens da alimentação, mas não deixa de comprar. A despesa vai comprometendo parte cada vez maior do orçamento".

Especialistas apontam que a inflação dos alimentos contribui para a queda de popularidade do presidente Lula (PT). Segundo o professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio, “alimentação subiu muito desde 2020, tem ficado acima da inflação. Mesmo se parar de subir, está num patamar alto. Qualquer alta tem peso maior no bolso do consumidor. A carne deve subir menos este ano, 6%, mas depois de já ter aumentado 20% no ano passado". Essa sensibilidade do consumidor, que já convive com aumentos sucessivos, reforça a necessidade de políticas públicas mais eficazes para conter o avanço dos preços.

A economista Maria Andreia Parente, do Ipea, ressalta que o crescente peso dos alimentos no orçamento “potencializa” o impacto dos reajustes. Para famílias com renda doméstica muito baixa – de até R$ 2.202,02 –, o comprometimento pode chegar a 29%, evidenciando que o aumento dos preços, especialmente de produtos básicos como carne, frango, leite, ovos e pão, repercute de maneira mais intensa entre os mais pobres.

Ainda que o grupo alimentar pese menos para domicílios com renda superior (para lares com mais de 30 salários mínimos o gasto com comida passou de 9,23% em 2018 para 11,32% atualmente), a alta dos preços tem um efeito generalizado. No ano passado, fatores como a elevação de 27% do dólar frente ao real, os extremos climáticos provocados por El Niño e La Niña – que afetaram a produção de alimentos como o café, que registrou alta de 50,35%, e a carne, com 20% de aumento –, configuraram uma verdadeira “tempestade perfeita”, segundo Braz.

Diante desse cenário, o pesquisador alerta que os curtos intervalos entre os fenômenos climáticos – antes ocorrentes a cada cinco ou sete anos, e agora a cada dois – tornam o controle da inflação dos alimentos ainda mais desafiador. Ele destaca que "normalmente, boa parte desses aumentos acumulados na carne, no leite, em verduras, legumes e frutas teriam sido devolvidos. Mas não é o que está acontecendo".

Essa dinâmica dificulta o trabalho do Banco Central, já que a inflação dos alimentos, por ser menos sensível à alta dos juros, limita o espaço de manobra da política monetária, aumentando a pressão sobre os orçamentos domésticos.

Entre as medidas governamentais para mitigar esses impactos, está a retomada dos estoques reguladores, como o do milho. Contudo, enquanto essa estratégia pode oferecer algum alívio para determinados produtos, especialistas como o professor Cunha apontam que, no caso da carne, essa medida não surtirá o mesmo efeito.

No campo da pesquisa, a Embrapa, em parceria com a Unicamp, tem investido no desenvolvimento de sementes de milho com maior tolerância a condições adversas – seca, calor excessivo e alagamentos. Juliana Yassitepe, pesquisadora da Embrapa Agricultura Digital, explica: "isso nunca foi um problema, não causava perda econômica. Com aumento da temperatura, o inseto se multiplica mais rápido. Não há proteção ainda para esse tipo de praga. Estamos com dificuldade de prever condições climáticas para nos prevenir. Houve geada em Goiás, onde nunca havia acontecido".

Diante da conjuntura de fatores – desde as oscilações climáticas até as variáveis econômicas globais –, o impacto dos preços dos alimentos sobre o orçamento das famílias se torna uma preocupação crescente para a sociedade brasileira. As medidas a serem adotadas, tanto pelo governo quanto pelo setor produtivo, serão fundamentais para amenizar os efeitos desse cenário, garantindo maior estabilidade e segurança alimentar para os mais vulneráveis.

Fonte: Brasil 247 com informações do jornal O Globo

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