quarta-feira, 18 de setembro de 2024

Deputados trumpistas articulados com bolsonaristas anunciam projeto para barrar entrada de Alexandre de Moraes nos EUA

 Iniciativa de parlamentares faz parte de ofensiva para pressionar Suprema Corte brasileira


Segundo Malu, dois parlamentares do Partido Republicano dos Estados Unidos ligados a Donald Trump e articulados com bolsonaristas brasileiros protocolaram nesta terça-feira (17) na Câmara dos Deputados americana um projeto de lei que, se aprovado, pode barrar o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes de entrar no país ou até mesmo de deportá-lo, caso a legislação entre em vigor e o magistrado esteja em solo americano.


Leia as demais informações publicadas pela repórter:


“O texto de autoria da deputada María Elvira Salazar, da Flórida, e do veterano Darrell Issa, da Califórnia, ambos apoiadores do ex-presidente Donald Trump, torna “inadmissíveis” e sujeitos à deportação “agentes estrangeiros” que venham a infringir o direito de liberdade de expressão por meio de censura a cidadãos dos EUA em solo americano.


A articulação do projeto, segundo apurou a equipe do blog, contou com a colaboração ativa de bolsonaristas radicados nos Estados Unidos que vêm costurando junto a parlamentares trumpistas uma ofensiva contra o Supremo pelo que apontam como violação ao direito da liberdade de expressão, previsto de forma irrestrita pela primeira emenda da Constituição americana. A proposição protocolada na terça seria o primeiro passo da estratégia.


Entre as supostas transgressões citadas por apoiadores de Jair Bolsonaro estão a derrubada de perfis de aliados ou militantes do ex-presidente nas redes sociais por meio de inquéritos sigilosos e a própria suspensão da rede social X no Brasil no último dia 30, depois que a companhia se recusou a nomear um representante oficial no país para acatar decisões do Supremo.


O argumento é que as restrições de perfis por ordem de Moraes em inquéritos como o das milícias digitais já atingiram brasileiros com cidadania americana ou residência fixa nos EUA. O projeto apresentado ontem prevê justamente sanções a autoridades estrangeiras que violem o direito à liberdade de expressão de cidadãos dos Estados Unidos que estejam em solo americano.


O texto é feito sob medida para contemplar os casos de figuras como Paulo Figueiredo e Rodrigo Constantino, que também são cidadãos americanos, têm canais de direita e tiveram suas redes sociais bloqueadas e passaportes cancelados por ordem de Alexandre de Moraes no âmbito do inquérito das fake news.


Em um comunicado conjunto, os deputados María Elvira e Issa deixaram claro que a iniciativa é movida pela decisão de Moraes de suspender a rede social X, consumada no último dia 30. A deputada afirmou que Alexandre de Moraes representa a “vanguarda em uma cruzada internacional contra a liberdade de expressão e cidadãos como Elon Musk”, em referência ao dono do X, e argumentou que o direito previsto na primeira emenda é “natural e inalienável” e não deve ter fronteiras.


Já o veterano parlamentar da Califórnia, presidente da seção do Comitê Judiciário (equivalente à Comissão de Constituição e Justiça no Brasil) voltado para assuntos da internet, foi ainda mais direto na nota divulgada ontem.


“Todos estamos cientes do abuso de poder cometido pelo Supremo Tribunal Federal no Brasil, que tem Elon Musk em sua mira e bloqueou o acesso ao X, uma companhia privada americana”, declarou Issa. “Com este projeto, autoridades de governos estrangeiros estarão avisados: se negarem aos nossos cidadãos os direitos da primeira emenda, negaremos sua entrada nos EUA ou mostrar a porta de saída”.


A lei proposta pode servir como elemento de pressão, mas dificilmente avançará a poucos meses das eleições americanas e do encerramento dos mandatos parlamentares. Além disso, o texto hoje não passaria no Senado controlado pelos democratas. E se passasse, a lei possivelmente seria vetada por Joe Biden, que mantém boas relações e agendas bilaterais com Lula e o Brasil.


Tanto María Elvira quanto Issa são apoiadores do ex-presidente Trump, que disputa a eleição presidencial de novembro contra a atual vice-presidente, a democrata Kamala Harris.


O partido de Trump comanda a Câmara dos Representantes, como é chamada a Casa Legislativa dos deputados nos EUA, enquanto o Senado conta com uma maioria democrata apertada. Mas o controle das duas Casas também está em disputa. Só depois que for definido qual partido terá maioria em cada uma delas se saberá quais projetos têm mais probabilidade de ser aprovados. As pesquisas indicam que tanto a Câmara quanto o Senado terão disputas competitivas.


Ainda assim, bolsonaristas radicados nos Estados Unidos esperam que o projeto de lei seja o começo de uma ofensiva contra o STF para pressionar a Corte a rever suas decisões sobre o X e os inquéritos que hoje estão sob o comando de Moraes. Eles afirmam nos bastidores que outras medidas estão sendo articuladas com parlamentares republicanos.


Como publicamos no blog no último dia 4, a nota da embaixada dos Estados Unidos em Brasília citando a importância da liberdade de expressão “em uma democracia saudável” ao comentar a suspensão do X, antes mesmo do Supremo oficializar a decisão, causou preocupação na Corte.


Ministros manifestaram sob reserva o temor com a possibilidade de retaliações diplomáticas, como a revogação do visto de Alexandre de Moraes, já que as autoridades americanas não costumam se pronunciar sobre assuntos internos do Supremo. Mas, conforme apurou a equipe da coluna, a hipótese jamais foi cogitada pela diplomacia dos EUA.


Brasil na órbita da política dos EUA


A iniciativa é mais um episódio em que o Brasil se torna combustível para a guerra entre republicanos e democratas.

No ano passado, após os ataques às sedes dos Três Poderes no 8 de janeiro, deputados da base do presidente Joe Biden pediram ao governo a deportação do ex-presidente Jair Bolsonaro, aliado de Trump. Na época, ele estava autoexilado na Flórida e já era investigado pela intentona bolsonarista. O pedido dos democratas não foi acatado.


Os dois parlamentares que assinam o projeto de lei que mira Moraes concorrem à reeleição para mais um mandato de dois anos, e o distrito representado pela deputada em Miami, na Flórida, possui muitos eleitores de origem brasileira. O texto tem potencial para estimular a comunidade local a comparecer às urnas, já que o voto não é obrigatório nos Estados Unidos.


A última disputa no distrito de María Elvira em ano de eleição presidencial, quando os índices de abstenção são bem menores do que as chamadas eleições de meio mandato, foi apertada.


Em maio passado, dois meses após a briga entre Elon Musk e Alexandre de Moraes escalar publicamente por conta de ordens do STF para a suspensão de perfis, a deputada desferiu duras críticas ao ministro e ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva em uma audiência da Câmara americana que contou com a presença de parlamentares brasileiros como Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e Nikolas Ferreira (PL-MG).


María Elvira exibiu uma foto de Moraes e, ao se referir ao magistrado equivocadamente como presidente do Supremo, o chamou de “operador totalitário” de um “presidente condenado por corrupção”, em referência a Lula, que elegeu Elon Musk como alvo na tentativa de “cercear” a liberdade de expressão no Brasil. Desde então, a parlamentar da Flórida se tornou uma espécie de defensora da causa da direita brasileira contra Moraes no Congresso dos EUA.


Já Darrell Issa deve enfrentar uma eleição mais tranquila em seu distrito de maioria republicana na ultraliberal Califórnia de Kamala Harris, mas sua co-autoria traz maior peso à iniciativa pela experiência de vários mandatos e sua atuação em projetos ligados à tecnologia e à internet no passado.


Os bolsonaristas e os deputados aliados de Trump sabem que o projeto só terá alguma chance de ser aprovado caso o republicano ganhe as eleições e conte com um Congresso amplamente favorável a ele.


Fonte: Agenda do Podercom informação da repórter Malu Gaspar em seu blog em O Globo.

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