Em Pequim, presidente do Supremo diz que a discussão hoje é se o Marco Civil prevê responsabilização “suficiente” dessas empresas
O presidente do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, afirmou na quarta (3) que pretende pautar para este semestre a ampliação da responsabilidade das plataformas digitais pelo conteúdo que veiculam no Brasil. Ele está em Pequim a convite do Supremo Tribunal Popular da China, numa visita com foco em questões de tecnologia.
Barroso disse estar só esperando o sinal verde dos relatores de dois casos, os ministros Dias Toffoli e Luiz Fux. “Assim que eles liberarem para julgamento, eu vou pautar.” São dois processos que abordam o Marco Civil da Internet, como é conhecida a lei 12.965, de 2014, que disciplinou o uso da internet no país.
“O Marco Civil prevê que as plataformas só são responsabilizáveis se, após decisão judicial, elas não removerem conteúdo”, disse Barroso. “Era uma norma que eu considero positiva, para quando ela foi editada. Mas hoje se discute se é suficiente ou se é preciso haver outras exceções em que as plataformas devam remover conteúdo. Essa é a discussão que vai ser travada.”
O presidente do Supremo acrescentou que será dada atenção também, no semestre, à “epidemia de litigiosidade” que ele identifica no país. Prevê esforços na área trabalhista, “para que o empresário tenha motivação de empregar mais gente e formalizar”, e no transporte aéreo, adiantando que “não se pensa em descartar a presença do advogado, mas torná-lo, em muitos casos, antes um negociador do que um litigante”.
Barroso foi convidado a visitar a China, com programação negociada entre Pequim e sua equipe, após receber em maio o presidente do Supremo chinês no Rio de Janeiro para o chamado J20 — que contou com delegações de todos os membros do G20, grupo que reúne países ricos e em desenvolvimento, presidido neste ano pelo Brasil.
Um dos temas do J20 foi inteligência artificial, também central agora, na viagem. O ministro participa da conferência sobre governança de IA que acontece a partir desta quinta, em Xangai. “Algum grau de regulação de inteligência artificial é imprescindível”, diz ele, acrescentando que é um debate que, no Brasil, está com o Congresso.
“Eu, para falar a verdade, estou mais preocupado em ferramentas de inteligência artificial que possam aprimorar a eficiência do Judiciário”, diz. “Temos interagido com as Big Techs, Google, Microsoft, Amazon, e viemos saber o que eles estão fazendo aqui. Pretendo ter reuniões do meu pessoal de tecnologia da informação no Brasil com os deles aqui.”
Diz estar em busca de duas ferramentas em especial. “Para já, é uma de pesquisa de precedentes. O Brasil mudou um pouco seu sistema jurídico, se aproximou do modelo anglo-saxão em que os precedentes são vinculantes. Mas nós decidimos em grande volume no Brasil, então precisamos de uma ferramenta que ajude a localizar esses precedentes.”
Diz que já existe um projeto com a Microsoft, no Paraná, “mas custa muito caro e, portanto, se alguém oferecer uma alternativa mais barata, vou considerar”. Em Xangai, além da conferência, deve visitar ao menos uma empresa de tecnologia.
A outra ferramenta que Barroso busca, “para o futuro”, envolve IA no preparo das decisões. “As pessoas ainda torcem um pouco o nariz, mas é inevitável você ter um primeiro rascunho da decisão, em algumas matérias, feito por inteligência artificial”, diz. “Nos casos repetitivos, pode ser uma excelente solução, sempre sob supervisão judicial.”
Já está em “teste de conceito” no Supremo uma ferramenta de IA para sintetizar processos. “Chega um com 20 volumes e você tem um programa que é capaz de ler aquele material todo, destacar o que é mais importante e fazer o resumo”, diz. Não soube precisar de qual empresa, mas respondeu que foi resultado de chamada pública com duas dezenas de participantes, inclusive as Big Techs estadunidenses.
Em sua primeira viagem à China, Barroso buscou delimitar o que busca no país: “Do ponto de vista político, são modelos muito diferentes. Portanto, aprender no sentido de aumentar meu nível de conhecimento é bom. No sentido de transplantar ideias políticas, não. É um outro mundo. E eu também não vim aqui para julgar. Vim aqui para conviver e aprender um pouco”.
Segundo relato fornecido pelo próprio órgão, o presidente do Supremo Tribunal Popular, Zhang Jun, na conversa com Barroso, defendeu “promover a integração profunda de conquistas de inovação tecnológica, como ‘big data’ e inteligência artificial, com o trabalho judicial”. E que a tecnologia já vem “servindo juízes no tratamento de casos, melhorando a qualidade e a eficiência dos julgamentos” no país.
“Esperamos aprender com o Brasil e fortalecer a cooperação prática”, encerrou Zhang.
Fonte: Agenda do Poder com informações da Folha de S. Paulo.
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