quarta-feira, 17 de julho de 2024

Pauta anti-MST chega ao Senado e mobiliza bancada ruralista, que pretende criminalizar movimentos sociais do campo

 Propostas também dificultam a atuação pela reforma agrária e amplia os mecanismos de defesa do grande proprietário rural

A pauta anti-MST (Movimento dos Trabalhadores sem Terra) começa a chegar ao Senado Federal após avançar com rapidez durante o primeiro semestre na Câmara dos Deputados.


Senadores da bancada ruralista avaliam que a agenda agora deve ter mais dificuldade para caminhar. Afirmam que o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), deve manter o rito de tramitação passando por diversas comissões — enquanto seu par na Câmara, Arthur Lira (PP-AL), acelerou o andamento de alguns dos textos.


Do pacote anti-MST da bancada ruralista, três dos quase 20 projetos estão no Senado. Dois deles já passaram pela Câmara.


Em linhas gerais, o conjunto traz propostas para aumentar as penas para sem-terras e até criminalizar movimentos sociais do campo, além de dificultar sua atuação e ampliar os mecanismos de defesa do grande proprietário rural.


Por exemplo, os projetos tipificam a ocupação de terras como “terrorismo”, aumentam a pena para este tipo de estratégia, impedem que quem participe de ocupações possa ganhar benefícios de programas sociais do governo ou ser contemplado com cargos públicos.


Também permitem ao fazendeiro acionar a polícia para atuar sem necessidade de ação judicial e criam a delegacia de conflitos possessórios.


Deputados e senadores afirmam que existe uma ala da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária) descontente com o fato de que essa pauta, considerada por alguns como ideológica, ganhou tanto protagonismo. E opinam que o grupo deveria atuar de forma mais propositiva, com projetos voltados ao setor produtivo.


O próprio Pacheco já disse a líderes e presidentes de comissões que gostaria de ver mais projetos propositivos chegando ao plenário, embora não tenha comentado especificamente o embate entre agronegócio e MST.


Já um outro grupo dentro da bancada vê a agenda anti-ocupações como importante principalmente em período eleitoral, já que tem aderência na sociedade — e afirmam, inclusive, que pode ajudar o atual presidente da frente, Pedro Lupion (PP-PR), a se manter no cargo nas eleições da bancada, marcadas para fevereiro de 2025.


Lupion afirma que o ano eleitoral não tem tanta influência no andamento deste pacote, por ser um pleito municipal — e que seria diferente caso fosse uma corrida de nível nacional.


“No Senado temos uma bancada menor do que na Câmara, de tamanho e influência, mas com senadores combativos e com capacidade de articulação. A dificuldade é fazer a agenda chegar na pauta, no plenário”, afirma.


Outra matéria pautada acaba com o projeto Terra da Gente, do governo Lula (PT) — que define as terras disponíveis no país para assentar famílias. Também tem sido frequente a presença de membros do Instituto Pensar Agro — que dá subsídio técnico à FPA — na comissão.


“Nós aprovamos com rapidez, por exemplo, o marco temporal. Até senadores da base do governo votam nas pautas do agro, então creio que essas pautas vão andar com rapidez, a Frente Parlamentar da Agropecuária tem trabalhado para isso. Pretendo conversar com o presidente Pacheco em breve”, afirma o senador Alan Rick (União Brasil-AC), presidente da Comissão de Agricultura, a qual já vem sendo mobilizada para tentar fazer as matérias avançarem.


Dissidências


O avanço da pauta anti-MST, entretanto, não agrada a todos dentro da bancada.


Dois parlamentares influentes na frente afirmaram à reportagem, sob reserva, que uma ala, ainda que minoritária, entende que a agenda deveria priorizar matérias propositivas e tratar de questões do setor produtivo e de modernização do setor, com foco em eficiência e sustentabilidade.


Um congressista se queixa também de mudanças recentes no Pensar Agro, e diz que o instituto tem perdido o caráter técnico e atuado de forma mais política.


Eles reclamam que em 2024, por exemplo, os principais temas debatidos pela FPA foram, além da agenda anti-MST, o leilão do arroz e outras questões relativas ao governo federal. Por isso, veem nessa movimentação um cunho mais ideológico que voltado ao agronegócio em si.


O presidente da bancada atribui isso, porém, ao fato de que as propostas propositivas já foram aprovadas.


“O fato principal é que nós limpamos a pauta, literalmente. Nós vencemos com praticamente todas as propostas propositivas”, diz.


Ele ressalta ainda que alguns dos projetos desse tipo, como o do licenciamento ambiental, estão no Senado.


Presidência da FPA


Para se manter no cargo, o senador Pedro Lupion precisa de apoio para alterar o estatuto da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), que atualmente não permitiria sua reeleição. Por isso, parlamentares da bancada afirmam que o avanço dessa agenda anti-reforma agrária pode o ajudar.


“Temos excepcionais nomes para presidir a bancada, mas é algo que a gente não começou a discutir ainda”, diz Lupion.


O pacote anti-MST foi uma reação às ocupações do movimento, que ganhou força no tradicional “abril vermelho”, quando o grupo promove uma série de ações.


A jornada de lutas pela reforma agrária ocorre no mês de abril em memória do Massacre de Eldorado dos Carajás, quando, em 1996, vinte e um sem-terras foram assassinados pela polícia militar no Pará. Segundo testemunhas da época, a PM teria sido paga por um fazendeiro incomodado com a estratégia de ocupações do MST, que visa pressionar o governo a efetivar a reforma agrária.


Projetos anti-MST


A bancada ruralista juntou uma série de projetos, alguns deles fruto do trabalho da CPI do MST. Veja, abaixo, quais são.


No Senado


  • PL 709/2023: Impede que quem for considerado “invasor” de terra ocupe um cargo público. Aguarda designação de relator
  • PL 2250/2021: Caracteriza a ocupação de terras, chamada pelo agronegócio de “invasão”, como terrorismo. Está na Comissão de Defesa da Democracia
  • PL 2869/2023: Aumenta penas para crimes relacionados a questões de terra em áreas rurais. Está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

Na Câmara

  • PL 149/2003: Classifica ocupação de terras como terrorismo e eleva penas. Está na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ)
  • PL 1373/2023: Impede quem for considerado “invasor” de terra de ser beneficiário em programas sociais, de reforma agrária e de ter acesso a linhas de crédito. Está na Comissão de Agricultura
  • PL 8262/2017: Permite atuação da polícia em ocupações de terra sem necessidade de ordem judicial. Está na pauta da CCJ

Fonte: Agenda do Poder com informações da Folha de S. Paulo.

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