sexta-feira, 7 de junho de 2024

Presidente da Câmara quer acelerar projeto que proíbe delação de presos e criminaliza divulgação dos depoimentos

 Não está claro se texto pode anular delações já validadas, como as de Mauro Cid nas acusações contra Bolsonaro

O presidente da Câmara dos Deputados, deputado Arthur Lira (PP-AL), decidiu pautar um requerimento de urgência que proíbe a validação de delações premiadas fechadas com presos e criminaliza a divulgação do conteúdo dos depoimentos.


A delação premiada é um meio de obtenção de prova. O acusado ou indiciado troca benefícios, como redução da pena ou progressão de regime, por detalhes do crime cometido.


A proposta foi apresentada em 2016, na esteira da Lava Jato, pelo advogado e então deputado do PT, Wadih Damous.


Àquela altura, o governo da presidente Dilma Rousseff enfrentava a abertura de um processo de impeachment e o avanço da operação, comandada pelo ex-juiz e atual senador, Sergio Moro (União-PR).


O projeto foi protocolado semanas antes da divulgação da delação premiada do ex-senador Delcídio Amaral, que provocou um terremoto político em Brasília.


Se há 8 anos a intenção era proibir que réus presos da Lava Jato delatassem para obter benefícios e evitar a divulgação de conteúdo atingindo o governo do PT, atualmente o cenário aponta para outra direção.


Com expoentes da extrema-direita envolvidos em atos golpistas e episódios que resvalam no ex-presidente Jair Bolsonaro, o projeto pode beneficiar a ala ideologicamente oposta ao evitar que prisões possam ser usadas como instrumento de pressão psicológica para obter confissões.


Além disso, não está claro se o texto pode ou não retroagir para anular delações premiadas já validadas, como a do ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), Mauro Cid, que atinge diretamente o ex-presidente.


Quem pediu a urgência?


O requerimento de urgência permite a votação do texto diretamente em plenário. A competência para colocar em votação, no entanto, é do presidente da Câmara.


O primeiro signatário é o deputado Luciano Amaral (PV-AL) que, embora pertença a um partido que integra a federação partidária com PT e PCdoB, votou pela soltura do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), acusado de ser um dos mandantes da execução da vereadora Marielle Franco.

Além dele, assinam o requerimento os líderes:


  • Romero Rodrigues (PODE-PB)
  • Elmar Nascimento (União Brasil-BA)
  • Aureo Ribeiro (SDD-RJ)
  • Altineu Côrtes (PL-RJ)
  • Isnaldo Bulhões Jr. (MDB-AL)

O que diz o projeto


Conforme o texto, só poderá ser validada pela justiça a delação premiada fechada se o acusado ou indiciado estiver respondendo em liberdade ao processo ou investigação instaurados em seu desfavor.


A proposta também cria pena de 1 a 4 anos e multa para quem divulgar o conteúdo dos depoimentos colhidos, estejam eles pendentes ou não de validação judicial.


“A medida se justifica para preservar o caráter voluntário do instituto e para evitar que a prisão cautelar seja utilizada como instrumento psicológico de pressão sobre o acusado ou indiciado o que fere a dignidade da pessoa humana, alicerce do estado democrático de direito”, diz a justificativa apresentada pelo deputado para protocolar o projeto.


Vale para delações antigas?


O texto não diz, mas juristas avaliam que, por se tratar de matéria de direito processual penal, as regras não poderiam retroagir para atingir delações premiadas já homologadas, como a de Mauro Cid.


Neste cenário, Bolsonaro não seria beneficiado com a invalidação das acusações e provas apresentadas pelo ajudante de ordens.


Em entrevista ao Estudio I, o autor do texto reforça esta posição.


“Se a intenção desses parlamentares for anular delações já homologadas, vão dar com os burros n’água. Isso é um projeto de lei de lei de direito processual penal”, afirmou. “O projeto foi apresentado dentro de um determinado contexto. O que me causa espécie e indignação é que ele esteja sendo manipulado oportunisticamente”.


Parlamentares ouvidos pela reportagem dizem que o tema deve ser judicializado e a decisão caberá ao Supremo Tribunal Federal (STF). Na avaliação deles, no entanto, não há clima para a anulação de delações já homologadas e que miram Bolsonaro.


É matéria processual. A questão da retroação ou não é norma processual, ela vige da sua edição pra frente. Aquele ato processual estaria válido, mas se aprovar lei haverá brechas para questionamento”, afirmou o advogado criminalista Michel Saliba.


Ainda que tenha efeitos apenas para casos futuros, as regras, se sancionadas, poderiam alterar o curso do caso Marielle se aplicadas a novos delatores.


Pode criminalizar a imprensa?


Segundo especialistas, criminalizar a imprensa é inconstitucional.


“Seria inconstitucional. O trabalho da imprensa, como ela obtém ou deixa de obter algo, é o sigilo da fonte. É uma coisa que deve ser respeitada. É algo fundante para o estado demcratico de direito”, afirmou Saliba.


Fonte: Agenda do Poder com informações do g1.

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