Discussão ganhou força em meio às investigações sobre o assassinato de Marielle Franco. Sessão do plenário virtual está marcada para sexta-feira
Quase seis anos após restringir o alcance do foro privilegiado, o Supremo Tribunal Federal (STF) vai debater novamente o assunto a partir de sexta-feira. Um recurso enviado pelo ministro Gilmar Mendes será analisado no plenário virtual e tem o potencial de atualizar os critérios definidos em 2018.
A discussão ganhou força quando a Corte se tornou o foro competente para as investigações envolvendo os supostos mandantes dos homicídios da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes.
Segundo o portal do jornal O Globo, a suposta participação do deputado Chiquinho Brazão (sem partido), apontado pela Polícia Federal como um dos responsáveis, fez com que o caso fosse alçado ao STF, que tem a atribuição de julgar parlamentares federais. Na época do crime, no entanto, ele era vereador, e as investigações apontam que o crime foi cometido em função de disputas fundiárias, o que não teria relação com o atual mandato de Brazão.
Quando restringiu o foro privilegiado, o Supremo decidiu que deveriam tramitar na Corte somente casos de deputados e senadores que tivessem cometido crimes durante o mandato e relacionados ao exercício do cargo. Antes, qualquer inquérito ou ação penal contra parlamentares, mesmo anteriores ao mandato, eram transferidos para o tribunal.
No despacho em que abriu caminho para uma nova discussão sobre os critérios para concessão de foro privilegiado, Gilmar afirma que é preciso “recalibrar os contornos” do mecanismo, destinado a pessoas com cargos públicos e mandatos eletivos. O portal apurou que, além do decano, outros ministros do Supremo já vinham defendendo que o tema fosse revisitado. Houve um acordo interno para que a discussão fosse pautada.
No tribunal, a expectativa é que eventual discussão sobre o alcance do foro não implique em uma “volta ao passado”, retornando ao formato que valia até 2018. A ideia é chegar a uma maior definição sobre casos específicos, detalhar melhor essas hipóteses e, assim, blindar o tribunal de críticas que poderiam ser feitas sobre uma insegurança jurídica e evitar contradições por parte do tribunal.
A restrição do foro privilegiado em 2018 foi motivada por uma questão de ordem apresentada pelo atual presidente do STF, Luís Roberto Barroso, em uma ação penal. No julgamento, o posicionamento do ministro, favorável à restrição, foi seguido pelos ministros Celso de Mello e Rosa Weber, hoje aposentados, além de Cármen Lúcia, Edson Fachin e Luiz Fux. Barroso, na época, apontava para uma sobrecarga do Supremo com ações penais envolvendo pessoas detentoras de foro, e criticava idas e vindas que levavam a prescrição de penas.
No julgamento, que se arrastou ao longo de meses, uma outra corrente reuniu ministros que achavam que a restrição deveria ser menor. Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski (hoje ministro da Justiça) reconheciam a competência do STF para julgamento de parlamentares federais nas infrações penais comuns, após a diplomação, independentemente de ligadas ou não ao exercício do mandato. Dias Toffoli e Gilmar Mendes, por outro lado, defenderam que a restrição do foro por prerrogativa de função seria incompatível com a Constituição.
Para Rubens Glezer, professor de Direito Constitucional e Filosofia do Direito na FGV SP, o país tem um problema “muito mal resolvido” com o foro privilegiado, uma vez que a discussão fica a reboque da conjuntura política e social.
“Quando houve o julgamento do mensalão, e havia punição à corrupção, todos os réus queriam fugir do STF. Os advogados diziam que era um absurdo, que não havia duplo grau de jurisdição, e que isso era uma aberração. Alguns anos depois, com o desenvolvimento da Lava-Jato, os partidários do combate judicial à corrupção passaram a dizer que o foro privilegiado era sinônimo de impunidade, que ninguém deveria ser julgado pelo STF e que o instituto deveria ser extinto”, pontua o jurista.
Fonte: Agenda do Poder com informações do jornal O Globo
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