Grupo de advogados e juristas destaca que uma CPI somente pode ser instalada para apuração de fato determinado, o que não consta no requerimento do vereador Rubinho Nunes
O grupo Prerrogativas emitiu uma nota em que manifesta “perplexidade” com a proposta de criação de uma CPI pela Câmara de Vereadores de São Paulo para investigar o trabalho social feito pelo padre Júlio Lancellotti e as Organizações Não Governamentais (ONGs) junto à população de rua na região da Cracolândia, no centro da capital paulista. Para o grupo, a criação de uma CPI para investigar o religioso é “além de ilegal e inconstitucional, imoral”.
“É com grande perplexidade que recebemos a notícia de que o vereador Rubinho Nunes, da cidade de São Paulo, propôs a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o Padre Júlio Lancellotti e as Organizações Não Governamentais (ONGs) que o auxiliam no trabalho de proteção aos moradores de rua e dependentes químicos”, diz um trecho do texto divulgado pelo coletivo que reúne coletivos juristas de todo o Brasil.
Ainda segundo o Prerrogativas, “cabe destacar que uma CPI somente pode ser instalada para apuração de fato determinado, conforme o art. 58 da Constituição Federal e Lei 1.579/1952. No entanto, conforme as declarações do vereador, trata-se de uma perseguição a uma pessoa verdadeiramente cristã, já que suas alegações são vagas e mentirosas”.
“Percebe-se, pois, a reação a um trabalho realizado junto aos moradores em situação de rua e dependentes químicos, pessoas indesejadas pelas elites do país. Tanto é assim que o próprio vereador, autor do pedido de instalação da CPI, não apresentou um projeto sequer para combater a miséria na cidade de São Paulo em seu mandato”, ressalta a nota.
O texto também destaca que “ao contrário de outras lideranças religiosas, que pregam o ódio ao diferente, o Padre Júlio não faz uso político da Igreja, não fomenta o pânico moral para destinar votos a determinados candidatos, nem busca vantagens pessoais”. “Há nítido preconceito contra os moradores em situação de rua e dependentes químicos, além de uso da máquina pública para atrair votos nas próximas eleições daqueles que compartilham da mesma ideologia segregadora”, denuncia.
Ao final do documento, o Prerrogativas destaca que irá se “calar diante da tentativa de prejudicar o trabalho do Padre Júlio Lancellotti. Os mesmos que o atacam se dizem cristãos apesar de não exercerem o cristianismo. O problema da chamada Cracolândia é muito complexo e, obviamente, não será completamente resolvido pelo projeto do Padre Júlio. No entanto, seu trabalho ameniza a dor e o sofrimento daqueles que mais precisam de ajuda. Essa CPI, além de ilegal e inconstitucional, é imoral”.
Leia a íntegra da carta do Prerrogativas.
"É com grande perplexidade que recebemos a notícia de que o vereador Rubinho Nunes, da cidade de São Paulo, propôs a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o Padre Júlio Lancelotti e as Organizações Não Governamentais (ONGs) que o auxiliam no trabalho de proteção aos moradores de rua e dependentes químicos.
Inicialmente, cabe destacar que uma CPI somente pode ser instalada para apuração de fato determinado, conforme o art. 58 da Constituição Federal e Lei 1.579/1952. No entanto, conforme as declarações do vereador, trata-se de uma perseguição a uma pessoa verdadeiramente cristã, já que suas alegações são vagas e mentirosas. Declarou o parlamentar municipal que o Padre Júlio Lancelotti seria um “explorador de moradores de rua”, que “não é uma unanimidade dentro da Igreja Católica” e que “seria um picareta à moda antiga”, que faz uso das ONGs como “laranjas” para lucrar politicamente com o “caos instaurado na Cracolândia”. Por fim, em nota, afirma que “vai investigar toda essa máfia da miséria que se perpetua no poder através de ONGs esquerdistas”.
Várias foram as ofensas e insinuações mas nenhum fato concreto foi apontado. A alegação de que o Padre Júlio seria colaborador de ONGs que fornecem materiais para o uso de substâncias ilegais é uma forma velada de atribuir o crime de tráfico de drogas, atitude degradante do vereador. O fornecimento de seringas e outros objetos para usuários de entorpecentes faz parte da política de redução de danos aplicada em diversos países que optaram por flexibilizar a “guerra às drogas” e é completamente lícito perante o ordenamento jurídico brasileiro.
Percebe-se, pois, a reação a um trabalho realizado junto aos moradores em situação de rua e dependentes químicos, pessoas indesejadas pelas elites do país. Tanto é assim que o próprio vereador, autor do pedido de instalação da CPI, não apresentou um projeto sequer para combater a miséria na cidade de São Paulo em seu mandato. Ao contrário, junto ao Movimento Brasil Livre (MBL), grupo do qual é integrante, vem frequentemente afirmando que o Padre Júlio seria uma espécie de “cafetão da miséria”.
Como é típico da extrema-direita brasileira, qualquer medida de política pública que tenha por objetivo reduzir a pobreza é tachada de “cabresto” ou de exploração. Foi, e ainda é assim, por exemplo, com os programas do Governo Federal, instituídos pelo Presidente Lula, em 2003, que são mundialmente reconhecidos e até copiados por outros países.
O trabalho do Padre Júlio é manifestação do Cristianismo na sua verdadeira essência. Ao contrário de outras lideranças religiosas, que pregam o ódio ao diferente, o Padre Júlio não faz uso político da Igreja, não fomenta o pânico moral para destinar votos a determinados candidatos, nem busca vantagens pessoais. Há nítido preconceito contra os moradores em situação de rua e dependentes químicos, além de uso da máquina pública para atrair votos nas próximas eleições daqueles que compartilham da mesma ideologia segregadora.
Políticas públicas devem ser pensadas pela Administração Pública, que, até o momento, empurra o caos da Cracolândia para baixo do tapete. Cabe, então, aos nobres vereadores, dentre os quais o proponente da CPI, exigir da Prefeitura medidas concretas e eficazes. Se a energia despendida pelos parlamentares que apoiam essa CPI fosse convertida em cobrança perante o Poder Executivo municipal, certamente teríamos uma cidade muito mais humanizada.
Não podemos nos calar diante da tentativa de prejudicar o trabalho do Padre Júlio Lancelotti. Os mesmos que o atacam se dizem cristãos apesar de não exercerem o cristianismo. O problema da chamada Cracolândia é muito complexo e, obviamente, não será completamente resolvido pelo projeto do Padre Júlio. No entanto, seu trabalho ameniza a dor e o sofrimento daqueles que mais precisam de ajuda. Essa CPI, além de ilegal e inconstitucional, é imoral.
O Grupo Prerrogativas, formado por profissionais de diversas áreas do conhecimento, com maioria composta por juristas, profissionais da advocacia especializados em múltiplos ramos do Direito; docentes de diferentes campos da ciência; integrantes de entidades da sociedade civil organizada, comprometidos, sem exceção, com os Direitos Humanos e com o Estado Democrático de Direito, vem a público, unissonamente, manifestar seu apoio ao Padre Júlio Lancellotti e repúdio à criação de uma CPI para “investigar” a sua atuação como Vigário Episcopal responsável pelo serviço pastoral em favor da população em situação de rua.
A medida causa perplexidade, na medida em que traz para a cena legislativa municipal uma discussão que haveria de centrar-se nas ineficiências e omissões da própria municipalidade e não nas ações de benemerência da Pastoral conduzida pelo Padre Júlio Lancellotti, sob os auspícios da Arquidiocese de São Paulo, sem auxílio do Poder Público municipal. A ele expressamos nossos reconhecimento pelo trabalho desenvolvido e solidariedade e comprometimento na luta contra a instrumentalização do combate ao seu trabalho com propósitos eleitorais inaceitáveis."
Fonte: Brasil 247
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