Prefeito Bruno Cunha Lima reservou os dias da folia para a “realização exclusiva” do “Carnaval da Paz”, que tem entre seus destaques um pastor estadunidense defensor da escravidão
Por Tiago Pereira, Rede Brasil Atual - O prefeito de Campina Grande (PB), Bruno Cunha Lima (União Brasil), proibiu o carnaval de rua entre os dias 8 e 13 de fevereiro. Decreto assinado na última sexta-feira (12) reserva os dias da folia para a “realização exclusiva de eventos ecumênicos” relacionados ao chamado “Carnaval da Paz”. Trata-se do “maior encontro de fé, espiritualidade e autoconhecimento do Brasil”, de acordo com a gestão campinense.
Os locais proibidos para os desfiles de blocos são: Açude Velho, Parque da Criança, Parque do Povo, Bairro do Catolé, Bairro do Centro da Cidade, Bairro do Santo Antônio, Bairro do Jardim Tavares, Bairro do São José, Bairro da Palmeira, Bairro da Liberdade, Bairro do Alto Branco, Bairro da Estação Velha. Além disso, o decreto proíbe a realização de blocos nas proximidades de shoppings, hospitais, clínicas, Batalhões de Polícia, Corpo de Bombeiros, centrais e delegacias de polícia, terminais rodoviários, aeroporto, batalhões do Exército e do complexo judiciário.
Ou seja, a proibição praticamente inviabiliza o carnaval nos principais pontos da cidade. De acordo com o portal G1, são 28 blocos, eventos particulares e alguns bois e troças que sofrem impacto da decisão. Assim, o decreto permite a realização dos festejos carnavalescos apenas em “clubes, áreas ou ambientes privados”. Diz ainda que as festas e blocos carnavalescos poderão ser realizados “normalmente”, antes ou depois da data determinada.
Pastor escravocrata é destaque do “Carnaval da Paz” - A “Consciência Cristã” é um dos eventos principais do “Carnaval da Paz”. É o mais importante congresso do campo evangélico calvinista, organizado pela Visão Nacional para a Consciência Cristã, associação conservadora liderada por diversas igrejas evangélicas. “Um evento Cristocêntrico para você que deseja viver de acordo com as Escrituras”, diz o site, que apresenta a programação composta por plenárias, conferências, seminários e cerimônias devocionais.
Neste ano, a estrela do evento é o pastor norte-americano Douglas Wilson, líder da Igreja de Cristo. De acordo com o site The Intercept Brasil, o pastor é “defensor contumaz da ideia de que a Bíblia autoriza a escravidão”. Nesse sentido, ele escreveu dois livros que buscam “tirar o estigma” do sistema escravista do sul dos Estados Unidos.
“Embora haja muitos palestrantes considerados moderados e não alinhados com o fundamentalismo, não se espera do congresso nada próximo de uma teologia progressista, defensora dos direitos humanos ou do diálogo inter-religioso. Com a vinda de Douglas Wilson, porém, o congresso cruzará uma linha inaceitável – a da defesa aberta da naturalização da escravidão”, destaca a reportagem.
Reação - Nas redes sociais, choveram críticas ao decreto do prefeito proibindo o carnaval de rua em Campina Grande, que fica a 125 quilômetros de João Pessoa. Os internautas lembraram de Gilead, república totalitária fundamentalista cristã do romance distópico O conto da aia, de Margaret Atwood. O evento “ecumênico” – o “Carnaval da Paz” – é tradição da cidade, mas até então não havia conflitado abertamente com a realização dos festejos carnavalescos.
“Sabemos que Campina Grande tem uma tradição de eventos desse tipo no período carnavalesco, mas nosso carnaval não é só isso. Temos vários blocos, bois, grupos de maracatu, ala ursas, papangus, escolas de samba e tantas outras manifestações que também precisam ter o direito de sair às ruas e fazer seus festejos de Carnaval”, escreveu no Instagram a vereadora Jô Oliveira (PCdoB-PB).
Ao mesmo tempo, a Defensoria Pública ingressou com ação civil pública no Tribunal de Justiça da Paraíba (TJ-PB), solicitando a suspensão dos efeitos do decreto do prefeito Bruno Cunha Lima. Na ação, o defensor público Marcel Joffily salienta que o Estado brasileiro é laico e destaca o Artigo 5º da Constituição Federal sobre a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença, “não se podendo permitir, portanto, privilégios ou favorecimentos de governantes a determinados grupos religiosos”.
Fonte: Brasil 247 com Rede Brasil Atual
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