segunda-feira, 28 de março de 2022

"Ministros estão muito irritados com Raul Araújo", diz Tereza Cruvinel

 "Ministros vão levar caso ao plenário do TSE só para ter uma decisão coletiva derrotando Raul Araújo", disse a jornalista

(Foto: Abr | Antonio Augusto/Ascom/TSE)


247 - Ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estariam irritados com a decisão do ministro Raul Araújo que proibiu a realização de manifestações políticas durante o festival Lollapalooza, que terminou nesse domingo (27). Segundo a jornalista Tereza Cruvinel, a decisão monocrática que atendeu a pedido do PL, partido de Jair Bolsonaro, não representa a visão do tribunal sobre a liberdade de expressão. 

"Ficou muito mal, parecendo que o TSE abençoa a censura. E não foi o TSE. Tanto que esta ação nem precisava ir ao plenário, porque ela já perdeu o objeto. Mas os ministros vão levar ao plenário só para ter uma decisão coletiva derrotando Raul Araújo", acrescentou Tereza Cruvinel.

O ministro Edson Fachin, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), afirmou que pretende levar “imediatamente” ao plenário da Corte a decisão monocrática do ministro do TSE Raul Araújo que censurou protestos no Lollapalooza. Na decisão, Araújo também estipulou o pagamento de uma multa de R$ 50 mil a ser paga pela organização do evento toda vez que a decisão fosse descumprida. O Lollapalooza, porém, não foi intimado a tempo e recorreu da decisão.

Leia também matéria do Conjur sobre o assunto: 

Decisão do TSE sobre Lollapalooza é 'manifestação distópica', diz Celso

A decisão que proibiu artistas de manifestar opiniões políticas no festival Lollapalooza foi classificada por Celso de Melo como "manifestação distópica da mais alta corte eleitoral" do país.

O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal fez um paralelo entre "1984", o romance clássico de George Orwell, e a decisão monocrática do ministro Raul Araújo, do Tribunal Superior Eleitoral, aludindo à "novilíngua", uma estratégia de manipulação de informação aplicada pelo governo totalitário do livro.

A manipulação da linguagem, no romance, é uma forma de controle do pensamento. O sistema funciona com base na supressão de termos ideologicamente indesejáveis ou pela atribuição de significados rígidos às palavras remanescentes.

Leia a íntegra da manifestação do ministro:

"PREOCUPANTE A NOVILÍNGUA DO TSE !!!!! CENSURA , PARA ESSE TRIBUNAL, É LIBERDADE DE EXPRESSÃO! IMPRESSIONANTE E ATUAL , NA EXPRESSÃO DE ORWELL, A MANIFESTAÇÃO DISTÓPICA DA MAIS ALTA CORTE ELEITORAL !

'O Grande Irmão está de olho em você'! O TSE , com essa recentíssima decisão no caso do espetáculo Lollapalooza, ter-se-ia transformado em instrumento da vocação totalitária do 'Grande Irmão' ('Big Brother')? E passou, na novilíngua do Estado totalitário, a observar (e a respeitar) o lema autocrático 'Guerra é paz. Liberdade é escravidão. Ignorância é força'? O poder totalitário do Estado é sempre um poder cruel e cínico, que proíbe o cidadão de pensar e de livremente expressar o seu pensamento e que o submete a um regime de opressão , interditando o dissenso, vedando o debate e impedindo a livre circulação de ideias !!!! Gravíssima a decisão do TSE ! Merece o repúdio dos que respeitam o regime democrático e a liberdade de manifestação do pensamento !".Liberdade sob ataque.

Ao G1, o ministro Luiz Edson Fachin, presidente do TSE, informou que vai colocar o caso em pauta no Plenário imediatamente, assim que o relator liberar o recurso. À jornalista Ana Flor, ele acrescentou que "a posição do tribunal será a decisão majoritária da Corte, cujo histórico é o da defesa intransigente da liberdade de expressão".A decisão monocrática foi duramente criticada por especialistas, especialmente por contrariar um precedente claro do Supremo Tribunal Federal. Na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.970, de outubro de 2021, o Plenário decidiu que os dispositivos que vetam showmícios (apresentações voltadas à promoção de candidatos) são constitucionais, mas que esse veto não impede que artistas manifestem suas opiniões políticas em apresentações próprias.

O item 3 do acórdão afirma especificamente que é "assegurado a todo cidadão manifestar seu apreço ou sua antipatia por qualquer candidato, garantia que, por óbvio, contempla os artistas que escolherem expressar, por meio de seu trabalho, um posicionamento político antes, durante ou depois do período eleitoral".

Em artigo publicado pela ConJur, José Maurício Linhares Barreto Neto também aponta que a decisão feriu uma resolução do próprio TSE, a 23.671/2021, que, em seu artigo 27, parágrafo 2º, determina que "manifestações de apoio ou crítica a partido político ou a candidata ou candidato ocorridas antes da data prevista no caput deste artigo, próprias do debate democrático, são regidas pela liberdade de manifestação".

Em relação às manifestações políticas feitas pela internet, o artigo 28, inciso IV, "b", parágrafo 6º, ainda acrescenta que "manifestação espontânea na internet de pessoas naturais em matéria político-eleitoral, mesmo que sob a forma de elogio ou crítica a candidata, candidato, partido político, federação ou coligação, não será considerada propaganda eleitoral".

O advogado Cristiano Zanin, responsável pela defesa do ex-presidente Lula, afirmou ao jornal digital Poder360 que a manifestação espontânea é resguardada pela liberdade de expressão. "A garantia constitucional da liberdade de expressão não pode ser colocada em risco e tampouco pode ser confundida com propaganda eleitoral antecipada, especialmente neste caso concreto, em que houve manifestação espontânea de artistas e do público. Esse entendimento, aliás, já foi reafirmado pelo STF no ano passado, no julgamento da ADI 5.970", afirmou o advogado.Já William Gabriel Waclawovsky, especialista em Direito Eleitoral, argumentou, também ao Poder360, que a decisão do ministro do TSE esbarra no acórdão do STF e "destoa da jurisprudência firmada tanto pelo STJ como pelo STF acerca da liberdade de expressão. A expectativa que temos é que a decisão seja reformada nas próximas horas, reafirmando o entendimento predominante dos Tribunais Superiores quanto à liberdade de expressão".De acordo com Fernando Neisser, presidente da Comissão de Direito Político e Eleitoral do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp), "criticar um governante em exercício ou cantar o nome de um possível candidato não são atos de propaganda antecipada ilegal, pois não há pedido explícito de voto nem uso de meio proibido pela lei".

Neisser também critica a imposição da multa: "Mesmo com relação à organização do evento, não se pode exigir que sejam responsáveis por atos de terceiros".



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