Extensa pesquisa científica realizada em Bangladesh mostra que o uso de máscaras é medida segura e barata para reduzir as infecções pela Covid-19, conforme afirmam médicos e cientistas e negam Bolsonaro e os bolsonarista
Rede Brasil Atual - O maior e mais rigoroso estudo sobre os efeitos do uso de máscaras quando se trata de conter o coronavírus em populações confirma o que os cientistas vêm dizendo há meses: elas funcionam.
Embora as máscaras tenham sido um dos principais protagonistas da pandemia, seu uso obrigatório para a população em geral em muitos países do mundo gerou e continua gerando grandes controvérsias. A quantidade limitada e a qualidade dos estudos científicos sobre máscaras no mundo real não ajudaram a dissipar algumas dessas controvérsias. Ao contrário da pesquisa sobre a utilidade de tratamentos ou vacinas contra a covid-19, cuja eficácia é relativamente simples de saber em ensaios clínicos, o uso de máscaras em nível comunitário enfrenta vieses e complicações significativas que dificultam conhecer sua verdadeira utilidade na limitação de infecções pelo SARS-CoV-2.
A principal complicação quando se trata de conhecer a verdadeira eficácia das máscaras para controlar epidemias de doenças infecciosas respiratórias surge do mesmo mecanismo de ação desses artefatos para o rosto: bloquear tanto a entrada quanto a saída de gotículas e aerossóis respiratórios com agentes infecciosos através da máscara. Assim, para avaliar corretamente a utilidade das máscaras, não basta estudar apenas as pessoas que as utilizam, mas também é necessário incluir indivíduos em contato com os anteriores que poderiam ter menos risco de contágio porque os primeiros usam uma máscara.
Em outras palavras, investigar o mais rigorosamente possível o verdadeiro valor das máscaras para limitar infecções no mundo real é um grande desafio científico, uma vez que envolve estudar um número considerável de pessoas dentro de uma comunidade. E, mesmo cumprindo este requisito, ainda haveria outros fatores que dificultam essa tarefa: o diferente grau de envolvimento ao usar a máscara, seu uso correto ou incorreto, a possível associação com outros comportamentos de proteção ou risco…
O estudo mais poderoso e rigoroso sobre o uso de máscaras
Em 31 de agosto, um artigo preliminar (preprint)foi tornado público, ainda não revisado por especialistas da área ou publicado em revista científica, com os resultados do maior ensaio controlado randomizado até o momento para descobrir o efeito da promoção do uso de máscaras ao limitar infecções por coronavírus em populações. Este gigantesco estudo abrange mais de 342 mil adultos de 600 aldeias em Bangladesh e foi realizado entre novembro de 2020 e abril de 2021. Cerca de 163 mil pessoas estavam no grupo controle, no qual não foi realizada nenhuma intervenção. No outro grupo, de 178 mil indivíduos, foram realizadas diferentes ações para promover o uso de máscaras (cirúrgicas ou pano) na comunidade.
Com base nos resultados de um estudo anterior, os pesquisadores selecionaram as medidas mais eficazes para aumentar o uso de máscaras entre a população geral de aldeias selecionadas em Bangladesh. Como explica o primeiro autor do estudo, Jason Abaluck, professor de economia da Universidade de Yale, a estratégia consistia em quatro ações: distribuir máscaras gratuitamente, oferecer informações sobre sua utilidade, reforçar seu uso em público por meio de indivíduos que pediam às pessoas que não usavam máscaras para usá-las, e convencer líderes políticos e religiosos a lembrar as pessoas da importância de usar máscaras. Dessa forma, os cientistas não só conseguiram aumentar substancialmente o uso de máscaras entre as populações selecionadas (de 13,3% para 42,3%), mas esse uso foi mantido ao longo do tempo.
Os pesquisadores entrevistaram os participantes do estudo periodicamente (cinco e nove semanas após o início do estudo) para descobrir se tinham sintomas típicos de covid-19 e, mais tarde, entre 10 e 12 semanas, realizaram exames de sangue (sorológico) naqueles que aceitaram para ver se tinham desenvolvido anticorpos para SARS-CoV-2.
Nas aldeias onde o uso de máscaras foi promovido, chegando a 42% em seu uso, observou-se redução do risco relacionado ao sofrimento de uma infecção com sintomas do coronavírus com anticorpos confirmados no sangue. No grupo controle, 8,6% das pessoas foram detectadas relatando infecções com sintomas e anticorpos da covid-19, em comparação com 7,6% das pessoas do grupo onde o uso de máscaras foi promovido. No entanto, o efeito observado foi muito diferente dependendo do tipo de máscara utilizada. Embora o efeito sobre a redução da covid-19 tenha sido significativo para máscaras cirúrgicas (redução de 11,2% no risco), este foi muito menor e não significativo para máscaras de pano (redução de 5% do risco). Os dados ponderados supõem, segundo os autores, uma redução do risco de 9,3%.
Os pesquisadores também observaram que o efeito protetor das máscaras foi muito mais acentuado entre pessoas com mais de 60 anos, com diminuição de pessoas infectadas com coronavírus, com sintomas e resultado positivo para anticorpos, de 34,7%. Esse achado pode ser devido ao fato de que pessoas mais velhas tendem a apresentar sintomas com mais frequência e, portanto, o estudo detectou infecção por coronavírus mais rigorosamente neles do que em jovens, onde muitas vezes passa despercebida.
Em suma, este estudo mostra que promover o uso de máscaras na população em geral, por meio de ações com eficácia comprovada, pode ser uma medida segura e barata para limitar, em certa medida, infecções pelo coronavírus na comunidade.
Limitações significativas
Embora este estudo seja, por enquanto, o melhor quando se trata de avaliar a diminuição das infecções sintomáticas do coronavírus graças ao aumento do uso de máscaras na população geral (no mundo real), ainda tem limitações importantes. Em primeiro lugar, não devemos subestimar o fator cultural. As ações podem ser comprovadamente eficazes na promoção do uso de máscaras em Bangladesh e ter um efeito diferente em outros países. Outro detalhe que limita o conhecimento do verdadeiro valor das máscaras para coibir infecções pelo SARS-CoV-2 é que elas não fizeram uma detecção ativa de infecções assintomáticas, por isso estavam fora do “radar” dos pesquisadores. Como consequência, isso poderia subestimar o efeito real das máscaras.
Outra limitação importante do estudo é que os pesquisadores observaram que nas aldeias onde foram realizadas as ações de promoção das máscaras, os moradores também seguiram mais a recomendação da distância de segurança. Isso, mais uma vez, torna difícil saber a real magnitude do efeito das máscaras. De qualquer forma, os autores do estudo pretendem continuar suas pesquisas para aprofundar a avaliação sobre o papel das máscaras faciais na prevenção de infecções por coronavírus.
Além de suas limitações (que todos os estudos científicos têm em maior ou menor grau), esta pesquisa é, até o momento, a melhor prova do valor das máscaras no mundo real para evitar infecções sintomáticas pelo novo coronavírus. Descobrir a verdadeira extensão do efeito das máscaras diante das epidemias é um verdadeiro desafio e este gigantesco estudo lança alguma luz sobre isso. Provavelmente, os efeitos das máscaras seriam muito mais evidentes se, em vez de aumentar moderadamente o uso de máscaras na população em geral, fosse possível estabelecer o uso correto e universal desses elementos protetores.
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