sábado, 13 de março de 2021

Attuch conta a história do 247 e fala sobre o futuro: espero que se torne um veículo coletivo, da própria comunidade de leitores

 

Criador do 247, o jornalista Leonardo Attuch conta a história de veículo que é hoje o maior meio de comunicação progressista do Brasil

Flickr 247 (Foto: Leonardo Attuch)


247 – Na segunda metade de 2010, o Brasil vivia o melhor momento econômico da sua história. Com crescimento econômico de 7,5%, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se preparava para deixar o cargo com 87% de aprovação. Foi naquele ambiente de otimismo dos brasileiros em relação ao futuro que Attuch, então redator-chefe da revista Istoé Dinheiro, decidiu criar o Brasil 247, que foi lançado efetivamente no dia 13 de março de 2011, há exatos dez anos. Nesta entrevista, ele conta um pouco da história deste veículo que é hoje o maior meio de comunicação progressista do Brasil.

Como surgiu a ideia de lançar o Brasil 247?

Lá pela segunda metade de 2010, quando eu comprei um tablet, um iPad, percebi que a informação se tornaria portátil e que isso representaria o fim lento, gradual e seguro da imprensa em papel. Na primeira onda da internet, muitos sites foram criados, mas as notícias eram lidas nos computadores. Com os tablets, veio a segunda onda, arrasadora, com a informação podendo ser consumida em qualquer lugar, a qualquer momento. Com todos lendo notícias o tempo todo nos celulares, a morte da imprensa em papel é uma questão de tempo.

Por que o nome 247?

Porque nossa ideia, desde o começo, era oferecer informação 24 horas por dia, sete dias por semana.

Politicamente, como o veículo pretendia se posicionar?

Naquele momento, não apenas nós, mas toda a mídia brasileira reconhecia os méritos dos governos progressistas. A Editora Três, onde eu trabalhava, fechava o governo Lula com a capa "Nunca fomos tão felizes". Esta era a realidade. Nascemos neste ambiente. O nosso objetivo era oferecer informações relevantes, abrindo espaço para todas as forças políticas, mas evidentemente reconhecendo que o Brasil acabava de viver um período de grande felicidade coletiva e de prosperidade.

Era possível antever a guerra midiática contra os governos progressistas?

Naquele momento, não. Inclusive, a própria ex-presidente Dilma Rousseff viveu anos de grande popularidade e aprovação midiática no início do seu primeiro mandato. Mas já eu imaginava que, em 2014, haveria forte oposição midiática a uma eventual volta do ex-presidente Lula, assim como a imprensa convencional fez com Getúlio Vargas nos anos 50. Guardadas as proporções, eu gostava de imaginar que o 247 poderia ser para Lula o que a Última Hora, de Samuel Wainer, foi para Getúlio Vargas. Lula não foi candidato, mas a guerra foi até mais intensa do que eu previa, e o resultado está aí: um Brasil destruído e aniquilado por uma imprensa golpista.

Como foram os primeiros anos do 247?

Nascemos de forma híbrida. Tínhamos uma edição para tablets, como se faz com um jornal normal, mas também um site de notícias. Fomos o segundo jornal para iPad no mundo. O primeiro, o The Daily, do Rupert Murdoch, morreu porque não lançou seu próprio site. Quando os sites de notícias se tornaram responsivos, ou seja, adaptáveis a qualquer tamanho de tela, o nosso jornal para tablets se tornou desnecessário. E assim viramos um site de notícias, como muitos outros, mas com muitas informações exclusivas sobre o governo Dilma.

Qual foi o impacto do golpe de 2016 para o 247?

Dilma caiu numa quinta-feira, 12 de maio de 2016, quando completei 45 anos, Michel Temer assumiu o poder usurpado numa sexta-feira 13, o que não deve ter sido coincidência. No dia seguinte, no sábado 14, ele já era pressionado a cortar a publicidade oficial dos "sites progressistas". Havia o mito, alimentado pela imprensa corporativa, de que esses veículos de comunicação só existiam porque recebiam publicidade governamental. A realidade provou que todos se mantinham em razão de suas audiências e dos recursos gerados pelas novas plataformas de publicidade programática. Mas algum tempo depois passamos a investir num modelo de assinaturas solidárias.

Como isso funciona?

É diferente do modelo dos jornais tradicionais, que colocam o "paywall", em que a pessoa só pode ler se pagar. No nosso caso, os assinantes são doadores. Fazem pagamentos recorrentes porque querem que o veículo continue existindo e tenha seu conteúdo aberto a todos os leitores e telespectadores. Ou seja: quem assina não paga para si, mas para toda a coletividade. Na nossa visão, a informação é um direito universal, e não uma propriedade.

Como surgiu a TV 247?

A ideia surgiu a partir de um encontro numa padaria com dois grandes jornalistas, o Florestan Fernandes Júnior e o Paulo Moreira Leite. Foram eles que trouxeram a ideia. Paralelamente, eu já vinha observando o Leonardo Stoppa e assistindo alguns vídeos feitos por ele. Consegui convencer o Stoppa a voltar da Inglaterra, montamos um estúdio em São Paulo, e iniciamos uma pequena grade de programas quando o Alex Solnik nos convenceu que teríamos público cativo. Hoje, temos mais de dez horas de programação diária, e fomos transformando grandes jornalistas, como o Mauro Lopes, a Gisele Federicce, o Aquiles Lins e muitos outros, em grandes apresentadores. E com o tempo a equipe foi sendo ampliada com grandes nomes do jornalismo, como a Tereza Cruvinel, o Rodrigo Vianna e mais recentemente o Joaquim de Carvalho.

Quais serão os próximos passos?

Somos muito cautelosos. Um passo de cada vez. Não assumimos riscos exagerados, não tomamos dívidas e só entramos em novos negócios de forma muito segura. Tínhamos a ideia de vir a ter uma "Academia 247", mas foi muito melhor e mais prudente nos tornarmos parceiros do Instituto Conhecimento Liberta, criado pelos amigos Eduardo Moreira e Jessé Souza. Por ora, estamos pensando numa estratégia de podcasts, para sermos também uma rádio.

E como se vê imagina o 247 no futuro?

Espero que dure pelo menos 300 anos. Para isso, ele terá que ser fiel a sua missão, que é a de “empoderar o público por meio da informação e do conhecimento e promover a defesa intransigente de uma democracia plena”. Também imagino um veículo de comunicação totalmente independente, controlado por sua comunidade de leitores e telespectadores – o que é viável no mundo de hoje, uma vez que não há mais barreiras de entrada na comunicação.

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