O ministro Gilmar Mendes foi enfático e disse que o então juiz "atuou verdadeiramente como um parceiro do órgão de acusação na produção de provas que seriam posteriormente utilizadas nos autos da ação"
Do Conjur - O 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal
publicou neste domingo (27/12) o acórdão do julgamento que anulou a sentença
condenatória proferida pelo então juiz Sergio Moro no caso Banestado, a
operação que o deixou famoso, em 2003. Na apreciação, que ocorreu em agosto
deste ano, o colegiado entendeu que Moro violou a imparcialidade que é exigida
dos magistrados.
Empatado, o
julgamento de agosto foi resolvido com a aplicação do in dubio pro reo. Os
ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski entenderam que Moro pulou o
balcão para se tornar acusador por ter colhido o depoimento da delação premiada
de Alberto Yousseff e por ter juntado documentos aos autos depois das alegações
finais da defesa.
Já o
relator, ministro Luiz Edson Fachin, e a ministra Cármen Lúcia, entenderam que
o então juiz não estava impedido. De acordo com Fachin, ainda que fosse o caso
de questionar os limites dos poderes instrutórios do juiz, não seria o caso de
declarar a imparcialidade judicial e afastá-lo do processo.
Não faltaram
críticas ao método de trabalho de Moro. O ministro Gilmar Mendes foi enfático e
disse que o então juiz "atuou verdadeiramente como um parceiro do órgão de
acusação na produção de provas que seriam posteriormente utilizadas nos autos
da ação".
"Esses
indícios denotam que a atuação do juiz foi de fato além da mera verificação das
condições de legalidade, regularidade e voluntariedade para a celebração de
acordos, passando a confundir-se com a do próprio órgão acusador. O juiz
efetivamente guiou e reforçou a tese acusatória com a direção do
interrogatório", afirmou Gilmar.
Ainda
segundo ele, "resta evidente, portanto, a quebra da imparcialidade do
juízo, o que finda por macular os atos decisórios por ele proferidos, já que
ausente o elemento base de legitimidade da jurisdição em um estado democrático
de direito".
Sem citar a série
de reportagens do The Intercept Brasil, conhecida como "vaza jato",
Lewandowski afirmou em seu voto que "coisas muito estranhas aconteceram em
Curitiba, naquela Vara Federal, que acabaram vindo à lume e foram amplamente
divulgadas pela imprensa".
"Como
se nota, a simples leitura das atas dos depoimentos revela, de forma indene de
dúvidas, uma evidente atuação acusatória do julgador. Com efeito, verifica-se a
proeminência da formulação de perguntas aos delatores as quais fogem
completamente ao controle da legalidade e voluntariedade de eventual acordo de
colaboração premiada. Todos nós conhecemos as técnicas de interrogação, se são
neutras ou se buscam induzir o interrogado a ofertar algum resultado numa
determinada direção", prosseguiu.
Banestado
Foi no caso
Banestado que Alberto Youssef tornou-se parceiro dos investigadores do Paraná:
o doleiro fez acordo de delação premiada e entregou diversos concorrentes do
mercado de venda ilegal de dólares. A partir das declarações e documentos
apresentados por Youssef, os investigadores — procuradores da República e
agentes da Polícia Federal reunidos na chamada força-tarefa CC-5 — acusaram
diversas pessoas de evasão de divisas e lavagem de dinheiro.
O caso
que a 2ª Turma julgou é de um dos alvos da força-tarefa, o doleiro Paulo
Roberto Krug. O caso foi levado ao STF pelo advogado Cal Garcia, com base em
parecer feito pelo professor da UFRJ Geraldo Prado. O julgamento havia sido
iniciado em setembro de 2019, no Plenário virtual. No entanto, foi levado ao
Plenário físico após o ministro Gilmar Mendes pedir vista.
A
corrente de entendimento do relator, ministro Luiz Edson Fachin, foi que a
participação de autoridade judicial na homologação do acordo de delação
"não possui identidade com a hipótese de impedimento prevista aos casos de
atuação prévia no processo como membro do Ministério Público ou autoridade
policial".
A
oitiva dos colaboradores no juízo, disse Fachin, é uma tarefa "ínsita à
própria homologação do acordo", de forma que não pode configurar
impedimento ou ser "equiparável às funções desempenhadas pelo Ministério
Público ou pela autoridade policial, cujas atividades encontram-se
intrinsecamente relacionadas à própria entabulação do acordo e à iniciativa
probatória".
O
ministro votou para negar o recurso do doleiro, mantendo a compreensão de seu
voto anterior, no qual ele criticava a "politização por que têm passado os
esforços por mais eficiência na Justiça".
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