Estudioso
do "lulismo", o cientista político André Singer, que foi porta-voz do
ex-presidente Lula, avalia a guinada política de Jair Bolsonaro, que começa a
trocar o eleitorado mais rico e de classe média por segmentos mais populares
André Singer e Jair Bolsonaro (Foto: Reprodução | ABr) |
247 – Um dos principais cientistas políticos do Brasil, o professor
André Singer, que foi porta-voz do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e
depois se dedicou a estudar o fenômeno do "lulismo" concedeu uma
importante entrevista ao jornalista Sérgio Roxo, do jornal O Globo, que deve
servir de alerta para a esquerda brasileira. Segundo ele, Bolsonaro começa a
ensaiar uma guinada política, em direção a um eleitorado mais popular, que pode
vir a ameaçar o chamado lulismo.
"Ainda não
sabemos muito bem o que aconteceu. Olhando superficialmente ocorreu uma espécie
de acidente. O governo fez uma proposta que foi inteiramente revertida pelo
Congresso e acabou, por meio dessa proposta, atingindo um eleitorado que nunca
tinha sido base do bolsonarismo. Não sabemos a extensão e a profundidade dessa
possível mudança. Seja como for, é muito claro que o governo decidiu se
beneficiar politicamente de tudo que ocorria e a viagem do presidente ao
Nordeste na semana passada é talvez o elemento mais visível dessa operação. O
governo Bolsonaro nunca foi próximo do Nordeste. Parece claro que algo está
acontecendo", disse ele, referindo-se ao auxílio-emergencial e à tentativa
de aproximação com o Nordeste.
"A mecânica do auxílio emergencial
fez com que as pessoas tivessem que abrir mão do Bolsa Família. É como se as
pessoas tivessem saindo do programa lulista e entrando num programa
bolsonarista. O governo começou a pensar numa estratégia inteligente, mas
depende de ter recursos, que é fazer com que as pessoas não voltem mais para o
Bolsa Família, mas entrem direto no Renda Brasil. Nesse caso, a pandemia criou
uma situação inesperada que pode facilitar uma transição inesperada. Porque o
Bolsa Família era muito consolidado. Não seria fácil simplesmente mudar de
nome, as pessoas iriam continuar chamando de Bolsa Família", afirma ainda
Singer.
O professor diz, no entanto, que não basta turbinar os
programas sociais, mas também colocar os mais pobres como eixo principal do
crescimento. "Se o governo Bolsonaro adotar uma política econômica, que
nunca esteve presente nos seus planos, de reativação da economia por baixo, aí
sim não há dúvida de que pode haver um novo realinhamento. Neste momento, é
visível o esforço do governo em encontrar dinheiro pra fazer alguma coisa, o
que já é uma novidade, porque esse governo nunca havia se preocupado com as
camadas mais pobres. E tem mais um acontecimento importante que é o governo
perdendo apoio na classe média", lembra Singer.
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