Para analista, objetivo é atingir resistência
contra o desmantelamento "do que resta do Estado de bem-estar social"
MP 873 confronta orientação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre o tema / André Borges | Agência Brasil |
Sem aviso ou discussão prévia, o governo publicou uma medida provisória, a MP 873, tornando ainda mais difícil a situação financeira das entidades sindicais, que já haviam sido atingidas pela "reforma" trabalhista (Lei 13.467, do final de 2017). O analista político Marcos Verlaine, assessor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), por exemplo, identifica, entre outros, um objetivo de "desarticular completamente a organização sindical".
Entre outras
determinações, a MP estabelece que a contribuição sindical está condicionada à
autorização "prévia e voluntária do empregado", e precisa ser
"individual, expressa e por escrito". O texto torna nula contribuição
mesmo referendada por negociação coletiva ou assembleia. E obriga a efetuar o
desconto via boleto, em vez de desconto em folha.
Isso
afronta nota técnica de 2018 do Ministério Público do Trabalho. Em um dos
itens, o MPT afirma que "a assembleia de trabalhadores regularmente
convocada é fonte legitima para a estipulação de contribuição destinada ao
custeio das atividades sindicais, podendo dispor sobre o valor, a forma do
desconto, a finalidade e a destinação da contribuição".
Para
dificultar um pouco mais, a MP 873 determina que a contribuição deve ser feita
por boleto bancário ou equivalente eletrônico, encaminhado à residência do empregado.
"Vê-se com isto a intenção clara de inviabilizar, destruir a organização
sindical, sem chances de essas entidades se restabelecerem", analisa
Verlaine, para quem a exigência de boleto agrava a situação: "Além de
retirar receita ainda gera despesas, pois as entidades precisam preparar
logística para que o trabalhador autorize o desconto e também para o envio do
boleto."
A
"reforma" trabalhista acabou com a obrigatoriedade da contribuição
(ou imposto) sindical, cobrado, no caso dos trabalhadores, uma vez por ano e
equivalente a um dia de trabalho. Esse imposto também existe na representação
patronal, calculado com base no capital social. Como fontes de receita, as
entidades sindicais podem aprovar contribuições normalmente chamadas confederativas
ou negociais, além das mensalidades dos associados. A MP dificulta seriamente
qualquer desconto, tornando ainda mais complicada a situação financeira das
entidades.
O
analista e assessor do Diap vê um propósito claro de "desalentar
importante setor de resistência ao governo e suas propostas que desmantelem o
que resta do Estado de bem-estar social".
A Força
Sindical divulgou nota em que aponta "irregularidades quanto ao
aspecto formal da medida, que por imperativo legal, necessita que a matéria a
ser tratada seja de relevância e urgência, o que obviamente não é o caso".
Segundo a central, o texto também tem inconstitucionalidade
"flagrante", ao ferir o princípio da liberdade sindical, promovendo
"interferência estatal na organização sindical brasileira". Além
disso, a entidade afirma que a MP 873 confronta orientação da Organização
Internacional do Trabalho (OIT) sobre o tema. E informa que está estudando
medidas inclusive jurídicas.
"É
importante lembrar que desde o início deste governo, a Força Sindical buscou o
diálogo democrático e a negociação, mas, infelizmente, na calada da noite o
governo edita esta nefasta MP demonstrando autoritarismo, despreparo e
indisposição para o diálogo", afirma a nota, assinada pelo presidente da
central, Miguel Torres. A entidade chama o texto de "AI-5 sindical".
A CTB
também atacou a medida, "mais um severo golpe contra o movimento sindical
brasileiro". "Fica claro e evidente que a MP tem o objetivo de
asfixiar e liquidar as organizações de classes dos trabalhadores, os sindicatos",
afirma a central, que identifica "total desrespeito e afronta à
Constituição".
"Estamos
diante de um cenário no qual cumpre ao movimento sindical uma estratégia de
resistência e a busca da mais ampla unidade para a luta em defesa dos
sindicatos, da democracia, da soberania nacional e dos direitos sociais e
trabalhistas", afirma o presidente da CTB, Adilson Araújo.
Fonte:
Brasil de Fato