"Vai depender de como o governo vai se
posicionar a partir de agora [...]. Se o governo agir dessa forma, e de certa
forma agir como Abraão – que ofereceu o seu filho em sacrifício [a Deus] –,
pode ser inclusive que o governo saia inclusive fortalecido, dado que a
população pode se solidarizar com o presidente", diz Carlos Pereira,
professor de Economia Política e de Políticas Públicas, da Escola
Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas
Sputinik – A decisão do
ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), em manter na
1ª instância as investigações do ex-PM Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador
Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), podem obrigar o presidente Jair Bolsonaro a seguir
uma passagem bíblica para se descolar do caso, segundo um analista ouvido pela
Sputnik Brasil.
Ao
manter o caso na Justiça do Rio de Janeiro e as investigações sob o comando do
Ministério Público fluminense (MP-RJ), o ministro do Supremo aumentou a pressão
sobre o filho mais velho do presidente, que nega envolvimento no caso, mas
tentou anular provas já colhidas envolvendo movimentações suspeitas de R$ 1,2
milhão de Queiroz.
Ouvido pela Sputnik Brasil, o professor de Economia Política e de
Políticas Públicas Carlos Pereira, da Escola Brasileira de Administração
Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (EBAPE-FGV), avaliou que o
episódio é sério e possui potenciais complicações ao presidente. Porém, ele vê
uma estratégia possível para Bolsonaro se fortalecer.
"Vai depender de como o governo vai se posicionar a partir de
agora [...]. Se o governo agir dessa forma, e de certa forma agir como Abraão –
que ofereceu o seu filho em sacrifício [a Deus] –, pode ser inclusive que o
governo saia inclusive fortalecido, dado que a população pode se solidarizar
com o presidente", comentou Pereira.
O docente da FGV ressaltou que, ao "entregar" o filho
para que responda à Justiça por eventuais erros cometidos no caso Queiroz,
Bolsonaro poderia colher dividendos políticos. Apesar de elogiar o fato do
atual governo não ter tentado interferir nas investigações, que começou após um
relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) apontar as
movimentações do ex-assessor de Flávio, Pereira mencionou que o presidente pode
ter problemas adiante.
"O problema maior do presidente Jair Bolsonaro eu acho que é
não dispor no Congresso de uma base sólida, estável e majoritária que sirva de
anteparo à eventuais acusações que venham a surgir, não só em relação ao seu
filho, mas em outras áreas. Normalmente se pensa que é importante se ter uma
base majoritária e sólida no Congresso para se aprovar o que quer, mas muitas
vezes é importante ter uma base sólida justamente para se aprovar ou para se
obstaculizar o que não quer", avaliou.
"Quando o presidente não tem esse escudo protetor no
Congresso, fica muito vulnerável a potenciais escândalos, investigações, CPIs,
então acho que rapidamente o presidente Bolsonaro tem que aprender a
necessidade de construir essa base de sustentação sólida e majoritária no
Congresso para poder evitar ser tão suscetível a escândalos e a
vulnerabilidades que normalmente surgem diante de um mandato
presidencial", acrescentou.
A eleição do deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ) para mais um
mandato como presidente da Câmara dos Deputados pode ser visto como um bom
sinal para Bolsonaro (a situação no Senado segue indefinida). Contudo, a falta
de uma maior solidez no Legislativo deve custar mais caro ao governo, na visão
do professor da FGV.
"Se ele [Bolsonaro] tivesse construído essa base desde antes,
estabelecido quais seriam os termos de negociação, quais moedas estariam sendo
trocadas e com quais objetivos, se ele tivesse tido esse diálogo franco com a
sociedade, utilizando-se do seu carisma, de seu contato direto com a sociedade
ao invés de demonizar o presidencialismo de coalizão como ele fez, dizendo que
ia criar uma nova política... então agora, mesmo que o presidente aprenda
rapidamente, tente construir essa base, já vai ser em condições inferiores do
que seria se ele tivesse definido isso desde o início do seu governo",
explicou.
Para Pereira, a única certeza até aqui exposta pelo caso
envolvendo Queiroz e Flávio Bolsonaro é a de que as instituições de controle e
fiscalização no Brasil são sólidas e independentes, capazes de
"constranger políticos e governos". Bom para o país, pior para o
senador que, para Pereira, encontra-se em uma situação bastante delicada neste
momento.
"Acho que é uma afirmação de que as instituições de controle
estão firmes, altivas e independentes, capazes de constranger inclusive o novo
governo. E com a continuidade dessas investigações, do que já sabemos e já foi
divulgado, a situação do senador é muito delicada, porque a sucessão de
depósitos e movimentações financeiras suspeitas, mesmo por caixa eletrônico,
com valores muito similares, e bem como as supostas vinculações do senador com
seu assessor e também com pessoas vinculadas à milícia no Rio de Janeiro torna
a posição do senador muito delicada. Essas investigações tendem a vulnerabilizá-lo
ainda mais", finalizou.
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