A pedido de procuradores da força-tarefa da Lava
Jato, o juízo da 1ª Vara Federal de Curitiba ratificou a decisão tomada pelo
juízo da 1ª Vara Federal de Jacarezinho no dia 22 de novembro, e concedeu
liminar que determina a imediata desinstalação da praça de pedágio da Econorte
em Jacarezinho. Enquanto não efetivada a ordem, o tráfego na praça deve ser
livre, permanecendo abertas todas as cancelas. Além desta medida, a decisão
impôs à concessionária Econorte a redução imediata das tarifas em 26,75% em todas
as outras praças da empresa e a retomada do cronograma original das obras da
concessão. Por fim, a Econorte ficou obrigada a dar início às obras do Contorno
Norte de Londrina em 30 dias. A decisão também proíbe que o DER, o Estado do
Paraná e a União promovam novas modificações contratuais enquanto corre o
processo, além de determinar bloqueio de R$ 1 de um bilhão das contas bancárias
de empresas do Grupo Triunfo, controlador da concessionária.
A Ação Civil Pública anticorrupção movida pelo MPF,
inicialmente proposta perante a 1ª Vara Federal de Jacarezinho, foi transferida
para a 1ª Vara Federal de Curitiba por decisão do Tribunal Regional Federal da
4ª Região, em razão de possível conexão com outra ação anterior. Coube então ao
juízo da 1ª Vara Federal de Curitiba analisar os pedidos do MPF e ratificar a
decisão da 1ª Vara Federal de Jacarezinho que concedeu a liminar pedida pelo
órgão.
Essas duas decisões judiciais, tomadas por dois
juízos distintos e independentes, demonstram o acerto e a importância de se
determinar a imediata abertura de cancelas da praça de pedágio de Jacarezinho e
a imediata redução de tarifas em todos os pedágios da Econorte. Isso porque a
manutenção do referido pedágio e dos valores praticados pela concessionária
trará prejuízos irreparáveis aos usuários das rodovias, que continuarão pagando
tarifas que, de acordo com a investigação, decorreram de atos administrativos
ilegais, “comprados” por intermédio do pagamento de propinas milionárias a
agentes públicos do Estado.
O pedido decorreu do gigantesco esquema criminoso
identificado nas investigações da operação Integração, que apura a prática de
crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, estelionato e
peculato na administração das rodovias federais no Paraná. As irregularidades,
segundo o MPF, teriam se iniciado no ano de 1999, a partir de quando as
concessionárias passaram a pagar propinas para manter a “boa vontade” do
governo e dos agentes públicos na gestão das concessões.
Irregularidades nos aditivos – Na primeira fase da
operação Integração, que teve foco nas irregularidades da Econorte, foram
presos Nelson Leal Jr., ex-diretor do DER, e Hélio Ogama, ex-diretor da
Econorte. Ambos, que atualmente colaboram com as investigações, confessaram que
a elaboração dos aditivos ocorria em um contexto de pagamento de propinas. Já
na segunda fase da operação Integração, o aprofundamento das investigações
levou à prisão de dirigentes de outras concessionárias e também da regional
paranaense da ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias) –
João Chiminazzo Neto, então diretor da ABCR/PR, promovia arrecadação de
dinheiro vivo junto às concessionárias para, posteriormente, realizar
pagamentos de propinas a agentes públicos incumbidos de fiscalizar as
concessões, tanto no DER como na Agência Reguladora do Paraná (AGEPAR).
Vigorando o esquema de pagamento de vantagens
indevidas no DER/PR, em 2000 e 2002 o Estado do Paraná firmou aditivos
contratuais com todas as seis concessionárias. Esses aditivos geraram polêmica
e foram objeto de dezenas de ações judiciais, especialmente porque reduziram
investimentos e elevaram as tarifas em detrimento dos usuários.
Em 2012, análise de auditoria do Tribunal de Contas
da União (TCU) identificou diversas irregularidades nesses aditivos. Conforme a
Corte de Contas: 1) Embora os investimentos previstos no contrato original
tenham sido remanejados para os últimos anos das concessões, sem quaisquer
justificativas técnicas, desconectados das necessidades dos usuários dos
trechos rodoviários atingidos, os valores originalmente previstos para
restauração, recuperação e manutenção dessas obras não executadas permaneceram
incorporadas às tarifas de pedágio cobradas dos usuários. Assim, o usuário
pagou por um serviço que não foi executado; 2) A alteração do critério de
medição dos serviços realizados de “área estimada” para “quantitativo de
insumos” tornou a fiscalização menos eficaz e facilitou a utilização de
materiais de baixa qualidade que exigem maiores gastos com manutenção, em
benefício das concessionárias, eliminando assim o risco de execução assumido no
contrato original; 3) a ocorrência de significativas mudanças nos cenáios
econômicos, desde a época em que foram assinados os contratos, que impactaram o
custo do capital, eventualmente desonerando as concessionárias, não foram
consideradas nos ajustes promovidos, de modo a reduzir proporcionalmente as
tarifas cobradas dos usuários. Ao contrário, há indícios de que o fluxo de
caixa alterou-se em prol das concessionárias mesmo levando-se em conta, na
avaliação dos investimentos, o custo de oportunidade da época em que os
contratos foram assinados.
No caso da Econorte, a investigação identificou que
a concessionária dispunha de uma rede de contratos falsos e superfaturados para
produção de recursos em espécie e superfaturamento de custos operacionais. Para
a prática, se utilizava de uma empresa subsidiária (Rio Tibagi) e contava com o
aval e até com ordens dos altos executivos das holdings TPI e THP. Com isto,
produziam-se recursos para pagamento de propina e forjavam-se supostos
desequilíbrios no contrato de concessão, obtendo de forma fraudulenta aumentos
exorbitantes de tarifas de pedágio. O esquema envolvia também a supressão
indevida de obras, a exemplo do Contorno Norte de Londrina, que foi retirado do
cronograma da concessionária em aditivo assinado por Nelson Leal Jr. no dia 25
de janeiro de 2018.
Relevante também a instalação ilegal da praça de
pedágio de Jacarezinho, permitida pelo DER nos termos aditivos firmados em 2000
e 2002. A irregularidade já foi reconhecida pela justiça em milhares de ações
individuais, que têm resultado na concessão de isenções da tarifa de pedágio
aos usuários da rodovia que procuram a justiça.
O MPF pede na ação civil pública o reconhecimento
da nulidade de diversos aditivos ao contrato da Econorte, elaborados nos anos
de 2000, 2002, 2013, 2014, 2017 e 2018 em prejuízo dos usuários das rodovias
administradas. Todos estes atos administrativos foram elaborados num contexto
de corrupção de agentes públicos.
O valor mínimo estimado pelo dano causado pela
Econorte chega a mais de R$ 500 milhões. Deste valor, mais de R$ 159 milhões
seriam equivalentes apenas às tarifas exorbitantes. Com o pedido de danos
morais coletivos, o valor da causa ultrapassou R$ 1 bilhão. Trata-se, ainda, de
um valor mínimo, sem prejuízo de novos pedidos de reparação para o caso em que
novas apurações demonstrem um dano ainda maior.
Irregularidades começaram a ser apontadas pelo MPF
em 2013 –
As irregularidades na administração da concessão começaram a ser apontadas por
um grupo de trabalho do MPF em 2013. Na época, foram identificados 13 atos
secretos que beneficiaram as concessionárias, além de diversas doações
eleitorais suspeitas. Posteriormente, investigações da Operação Lava Jato
comprovaram que tais atos eram editados como contraprestação por propinas pagas
sistematicamente pelas concessionárias.
Risco de novas modificações ilegais – a liminar
obtida pelo MPF vedou a elaboração de aditivos novos enquanto correr a ação
civil pública. A decisão considerou o risco de que a Econorte busque novo
reequilíbrio contratual, a despeito das irregularidades sob apuração. Um
executivo do Grupo Triunfo, Carlo Botarelli, testemunhando na ação penal da
primeira fase da operação Integração, afirmou em juízo que a empresa buscaria
novo reequilíbrio devido às isenções concedidas pela justiça aos usuários da
BR-153.
A decisão proibiu expressamente a elaboração de
aditivo que promova novo aumento da tarifa para além do IPCA. Isto pois o
magistrado entende que o novo aumento pretendido pelo executivo favoreceria a
concessionária por uma irregularidade que ela mesma praticou (instalação ilegal
da praça de pedágio de Jacarezinho).
Redução de tarifas e retomada imediata de obras – Diante das provas de
irregularidades nos aditivos apresentadas pelo MPF, a decisão determinou
providências imediatas para reversão dos prejuízos verificados. A praça de
pedágio de Jacarezinho deverá ser desinstalada; enquanto não cumprida a medida,
as cancelas ficarão abertas. As demais praças da Econorte deverão reduzir
imediatamente em 26,75% as tarifas praticadas. As obras do Contorno Norte de
Londrina e as demais obras do cronograma previsto no contrato original deverão
ser retomadas em 30 dias.
A liminar obtida determina também que a União,
o Paraná e o DER/PR deverão se manifestar, em até 90 dias, sobre eventual
declaração de caducidade da concessão da Econorte e revogação do convênio de
delegação de rodovias federais.
Caso o Paraná decida pela caducidade da concessão
da Econorte, a empresa será retirada da administração das rodovias por ter
descumprido o contrato de concessão. O MPF, ainda, pretende que a União se
manifeste sobre a retomada das rodovias federais delegadas, uma vez que o
estado do Paraná teria mostrado inaptidão para gerenciá-las.
Lei Anticorrupção – Na ação, o MPF pede ao juízo a imposição de
sanções da Lei Anticorrupção a várias empresas do Grupo Triunfo. Em caso de
procedência, além da reparação do dano bilionário, as empresas podem ficar
impedidas de receber incentivos do poder público por até 5 anos. No caso da Rio
Tibagi, o MPF pediu a dissolução compulsória desta empresa, por entender que
“foi criada pela Triunfo com o propósito de burlar a legislação tributária e
produzir caixa 2 para a Econorte”.
Fonte:
Paranaportal
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