Uma cena corriqueira na nova Salvador higienizada de ACM Neto viralizou
nas redes sociais: um segurança do Shopping da Bahia tentou impedir um homem de
pagar o almoço de um menino de rua em uma lanchonete no Shopping.
Certamente esqueceu
que baiano não come reggae. O consumidor impediu que o menino fosse expulso do
restaurante e decretou, em frente à câmera de um cinegrafista amador: “Ele vai
comer! Chame o gerente, chame o segurança, chame quem você quiser (só faltou o
“chame o papa!”), mas ele vai comer!”
Os seguranças
tentaram arrastar o garoto pelo braço, mas o homem protegeu a criança e não foi
agredido (afinal, se está bem vestido e pode ser chamado de “consumidor”, pode
também ser considerado um ser humano).
No fim das contas, o
menino almoçou na praça de alimentação, conforme a promessa do homem
irredutivelmente empático.
Não gosto de
atribuir esse rótulo a muitos gestos – prefiro os anti-heróis, inclusive – mas
a atitude do homem diante da fascista política anti-pobres dos shoppings
centers foi heróica.
A empatia que parece
ter secado em pessoas como os seguranças do shopping (seguranças em geral, vide
o caso Habibs) floresce ainda em alguns humanos, como foi o caso.
Afora a atitude
louvável do homem, a cena é, entretanto, o reflexo da desumanização dos pobres:
um homem precisa se colocar como escudo humano para que uma criança moradora de
rua não seja escorraçada pelo segurança de um shopping onde até os cachorros de
madame podem passear.
Quem vive em Salvador
sabe que a vida por aqui não é fácil para moradores de rua.
Nas estações de
metrô, é proibido dar esmolas e o transporte ambulante (os famigerados baleiros
do busão) é inexistente. Pedras pontiagudas foram colocadas embaixo dos
viadutos para que moradores de rua não possam se abrigar – pra onde vão? Não
interessa, desde que a cidade pareça limpa.
O higienismo do
atual prefeito ACM Neto (DEM/BA) – herdeiro do carlismo, parceiro político de
João Dória –, e seu sucesso nas urnas, reflete, infelizmente, uma face medonha
da sociedade soteropolitana.
Daqueles que não
querem admitir que a pobreza existe, que a sujeira existe, que o real existe.
Que se recusam a almoçar na presença de um morador de rua. Que confundem
humanidade com poder de compra e cidadão com consumidor e curtem o novo Rio
Vermelho em porcelanato.
Enquanto houver
pessoas que peitem seguranças para defenderem seus semelhantes da brutalidade,
haverá, contudo, esperança.
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