Pode-se dizer que o
estouro das delações da Odebrecht pelo STF não foi politicamente cronometrado e
que atingiu todo o sistema político, mas é certo que a explosão criou o tempo
perfeito para a pressa que o juiz Moro tem de condenar o ex-presidente Lula em
primeira instância, com vistas à sua inelegibilidade. Com o depoimento do
ex-presidente marcado para o dia 3 de maio, numa espécie de juízo final que
pode resultar em confronto de manifestantes em Curitiba, Moro marcou para o dia
20 de abril, a próxima quinta-feira, o depoimento do executivo da OAS Léo
Pinheiro sobre o caso do tríplex do Guarujá. Não havendo até agora colhido
provas de que o apartamento pertença ou tenha pertencido a Lula, parece haver
uma aposta de Moro em revelações de Pinheiro e de outros executivos da OAS que
o incriminem.
Léo Pinheiro
será ouvido juntamente com outro executivo da empreiteira, Agenor Medeiros. No
dia 26 serão ouvidos Paulo Gordilho, acusado de comprar a cozinha planejada
para o tríplex, e os executivos Fábio Yonamine e Roberto Ferreira. O presidente
do Instituto Lula, Paulo Okamoto, prestará depoimento no dia 28.
No meio
jurídico, aposta-se que Moro dará a sentença de Lula nesta ação até o final de
junho, no máximo no início de agosto, encurtando o prazo que ele terá para
recorrer ao Tribunal Federal de Recursos em Curitiba, onde 95% das sentenças de
Moro têm sido mantidas. E aí a candidatura de Lula a presidente em 2018
entra num limbo jurídico de difícil previsão. Como as candidaturas devem
ser registradas até o final de junho, se até lá ele já tiver sido condenado nas
duas instâncias terá se tornado ficha suja ou poderá recorrer ao TSE? E se for
candidato com recursos pendentes de julgamento, poderá ter depois sua eventual
eleição contestada? Tudo isso não tem resposta agora, porque são questão que
habitam o mundo da crise e da disputa política, não o das regras eleitorais
ordinárias. Certo é que está em curso a ofensiva para impedir sua
candidatura.
O bode
expiatório
Com as
delações da Odebrecht reveladas em texto e vídeo, o país soube detalhes do que
nunca ignorou: que todo o sistema político era financiado por empresas numa
permanente troca de favores. Soube que a Odebrecht desembolsou R$ 1,68
bilhão para quase 500 políticos e lobistas, sob a forma de propinas ou doações
de campanha via caixa 2. Alguns nomes reluzentes da antiga oposição aos
governos petistas receberam as maiores somas, como Aécio Neves (R$ 50 milhões
só numa operação) e José Serra (R$ 23 milhões, sendo parte na Suiça).
Entretanto, apesar da doença sistêmica revelada. a mídia vem carregando
nas tintas contra Lula, por suas relações com a Odebrecht, como se fosse ele o
campeão das propinas e o arquiteto do descalabro. A Rede Globo tem lhe
dedicado espaços caudalosos e O Estado de S. Paulo, no editorial “A responsabilidade
de Lula”, neste domingo, afirma que ele é o maior culpado pela cooptação de
quase todos os partidos pela Odebrecht.
Em nota neste final de
semana, a defesa de Lula apontou a ausência de materialidade nas acusações,
como inexistência de provas de que ele pediu ou recebeu recursos de uma conta
virtual que existiria à sua disposição na empresa, ora no valor de R$ 35
milhões, ora no valor de R$ 40 milhões. Lembrou também a nota que, assim como a
Odebrecht, outras grandes empresas brasileiras mereceram a atenção do governo
Lula para viabilizar projetos de interesse nacional, domésticos ou
internacionais, contribuindo para o período de crescimento e afirmação nacional
verificados em seu período. Não só a Odebrecht teve acesso a créditos do BNDES
ou a outras medidas para sua internacionalização, dentro da política estratégia
do momento.
A nova
ofensiva contra Lula teve, inclusive, o efeito de “decepcionar” aliados que passaram
a criticá-lo, declarando estupefação diante das relações que ele tinha com
Emílio Odebrecht. Se há algo que Lula nunca escondeu foi sua natureza
conciliadora, em oposição a núcleos de origem “revolucionária” do PT, os que
vieram de organizações marxistas-leninistas ou da luta armada. Seu governo foi
de conciliação de classes, como bem resumido pelo próprio patriarca Odebrecht
quando disse, na delação, em outras palavras: Lula quis, e conseguiu, dar um
pouco aos pobres, retirando do Orçamento, sem tirar das classes dominantes, que
também muito ganharam. E ganhando, no entender de Lula, estavam gerando emprego
e riqueza para o país. Quem conhecia esta natureza de Lula não pode ignorar a
multiplicidade de suas relações e alianças, inclusive com empresários, que não
significa que elas eram movidas a corrupção. Nem pode agora sancionar a caçada
com recriminações desta ordem. Lula foi e continua sendo para o Brasil um
grande líder popular, intérprete das necessidades e dos sentimentos dos mais
sofridos, disposto a reduzir as grandes injustiças e desigualdades, dentro das
regras democráticas, observando e conciliando o interesse da Nação com as
necessidades dos despossuídos. Até o radical PCO vem dizendo isso: tem
divergências com Lula mas a hora é defende-lo, não de contribuir para que seja
banido.
Por Tereza Cruvinel
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